Governo escancara o desrespeito a pilares macroeconômicos

By | 25/11/2021 8:05 am

Aqui jaz a responsabilidade fiscal

Ao ignorar a exigência legal de fonte de receita para criar uma despesa permanente, governo escancara o desrespeito a pilares macroeconômicos

 

De todos os absurdos que o governo de Jair Bolsonaro executou nos últimos anos, chama a atenção em particular a desfaçatez com que regras fiscais consagradas foram rasgadas sem qualquer cerimônia. Com a desculpa de abrir espaço no Orçamento para socorrer a população mais carente, o Executivo apresentou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios para acabar com o teto de gastos e institucionalizar o calote nas dívidas já reconhecidas pela Justiça. Não satisfeito, foi além e decidiu ignorar um dos maiores pilares econômicos do País: a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Segundo o parecer do líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), relator da PEC, o Auxílio Brasil vai se transformar em uma despesa permanente no Orçamento mesmo sem ter uma fonte de receitas para financiá-lo, algo expressamente proibido pela LRF, que exige compensação para aumento de gastos dessa natureza. Com piso de R$ 400, o benefício vai alcançar 50 milhões de pessoas, quase um quarto da população.

Os recursos que vão irrigar essa política no próximo ano virão do sublimite ao pagamento dos precatórios e do drible no teto, cuja regra de cálculo foi modificada na tentativa de angariar votos para a reeleição do presidente Jair Bolsonaro. Para 2022, foi aberta uma “folga” de R$ 106,1 bilhões no Orçamento, dos quais R$ 51,1 bilhões serão destinados ao programa, segundo o Ministério da Economia. A partir de 2023, ninguém sabe como essa conta será paga.

A desculpa oficial é que esse problema é temporário, uma vez que o governo conta com a aprovação da reforma do Imposto de Renda (IR) para obter recursos definitivos para o novo programa. O discurso, reverberado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), é o de que a tributação sobre lucros e dividendos de pessoas jurídicas será a solução para o imbróglio.

Não é o que pensa o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Embora a reforma do IR tenha sido aprovada na Câmara, as chances de o texto avançar neste ano são, no mínimo, remotas e, no ano que vem, praticamente impossíveis. O relator, senador Angelo Coronel (PSD-BA), disse ao Estado que sua prioridade é atualizar a tabela do Imposto de Renda de pessoas físicas – algo que, por sinal, pode ser feito por decreto.

Assim, depois de acabar com o Bolsa Família, um programa consolidado e elogiado por especialistas, o governo prossegue no caminho de destruição de políticas públicas, agora sem nem mesmo ter fonte de recursos para o benefício social que pretende ser uma bandeira da gestão de Jair Bolsonaro. Para isso, defende mais um drible fiscal e a interpretação segundo a qual uma PEC prevalece sobre uma lei.

O texto sugerido por Bezerra Coelho na PEC estabelece que os limites e condições para atender ao Auxílio Brasil serão determinados por lei até 31 de dezembro de 2022. Esse projeto, por sua vez, não precisará cumprir limitações legais quanto à criação ou aperfeiçoamento de programa que acarrete aumento de gastos. Na prática, portanto, o Auxílio Brasil ficará fora do escopo da Lei de Responsabilidade Fiscal. De acordo com o senador, a intenção é cumprir a LRF no que for “aplicável”. A votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado ficou para o dia 30 de novembro.

No mercado, a manobra não surpreendeu. A dúvida que remanesce é até onde irão as aventuras populistas do governo. O resultado é bolsa em queda, juros elevados e real desvalorizado. Não bastasse o erro, o Congresso ainda trabalha para fixá-lo de forma permanente na Constituição.

Em um governo que se diz liberal na economia, a contribuição direta para o descontrole da inflação e do gasto público deveria ser motivo de vergonha. Além de desancorar as expectativas, a PEC dos Precatórios vai retroalimentar uma espiral perversa que deve transformar as dívidas judiciais da União em uma bola de neve para o próximo presidente. É bom lembrar que Dilma Rousseff foi defenestrada da Presidência por ignorar a responsabilidade fiscal com manobras e truques que parecem amadores perto do que o governo atual pretende fazer.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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