Inflação ameaça o fim de ano feliz

By | 25/11/2021 2:57 pm

Preços em alta e juros elevados freiam o consumo, cortam dezenas de bilhões das vendas do varejo e travam a economia

(/editorial dO Estadão, em 25/11/2021)

Bilhões de reais em vendas estão sendo perdidos pelo comércio neste último trimestre, normalmente o melhor do ano. A mistura de inflação elevada, juros altos e péssimas condições do mercado de trabalho afeta as condições do consumo. Já empobrecidas e com a renda erodida, mês a mês, pelo acelerado aumento de preços, as famílias se retraem, reconsideram os gastos e adiam os planos de compras. Duas das mais importantes datas para os lojistas, a Black Friday e o Natal, devem proporcionar ganhos muito menores que aqueles previstos no começo do ano, quando o País superava os primeiros efeitos da covid-19. Mas a receita do varejo, nestes meses finais, deve ficar R$ 44,7 bilhões abaixo dos R$ 792 bilhões estimados no início de 2021, segundo estudo realizado pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) a pedido do Estado.

Mesmo causando enormes prejuízos, preços mais altos geram maior arrecadação. Graças a isso o Ministério da Economia exibe contas em melhor estado, pelo menos neste momento. Mas o ganho seria maior e muito mais seguro se fosse baseado em mais produção, mais emprego e mais consumo. No entanto, a realidade, fora dos gabinetes ministeriais e presidenciais, continua sem sinais de prosperidade e sem perspectivas de melhora nos próximos meses.

O desempenho insatisfatório das vendas neste último trimestre deve contaminar a economia no começo de 2022. Quando os meses finais são bons para o varejo, a recomposição de estoques no início do ano seguinte movimenta a indústria. Isso ajuda a sustentar algum dinamismo num período de menor movimento. Esse efeito benéfico pode refletir-se no emprego, com renovação de contratos temporários típicos de fim de ano.

Além de afetar o varejo no trimestre final, as condições da economia poderão impedir ou reduzir desdobramentos positivos no começo de 2022. Todos os principais indicadores são ruins. A inflação em 12 meses passou de 10% e deve continuar nesse nível até o fim do ano. Os mais prejudicados, como sempre, são os consumidores de menor renda, com orçamento apertado e sem espaço para remanejamento de gastos. Sem surpresa, o indicador de confiança medido mensalmente pela Fundação Getulio Vargas (FGV) é tanto mais alto quanto maior a faixa de renda, mesmo quando a evolução geral é negativa.

Em novembro, o Índice de Confiança do Consumidor voltou a cair, recuando 1,4 ponto, depois de ter subido 1 ponto em outubro. Com 74,9 pontos, o menor valor desde abril (72,5), esse indicador ficou 7,1 pontos abaixo do nível de um ano antes, quando o Brasil se recuperava da grande crise de 2020. Em todas as faixas de renda o índice é inferior a 100%, fronteira entre otimismo e pessimismo. De novo, a diferença entre os níveis de confiança refletiu a distância entre as faixas de renda (85,3 pontos na mais alta e 63,1 na mais baixa).

“Apesar do avanço da vacinação, de suas consequências favoráveis na redução de casos e mortes e da flexibilização de medidas restritivas, o aumento da incerteza econômica diante da inflação elevada, da política monetária restritiva e do maior endividamento das famílias de baixa renda torna a situação ainda desconfortável e as perspectivas ainda cheias de ameaças”, comentou a Coordenadora das Sondagens da FGV, Viviane Seda Bittencourt.

Dirigida contra a inflação, essa “política monetária restritiva” consiste essencialmente em aumento de juros e encarecimento do crédito. O efeito imediato é doloroso para a família comum e para o empresário. Com a renda já prejudicada pelas condições de emprego e desgastada pela inflação, o consumidor sofre também os efeitos do crédito caro.

No mercado de trabalho o desemprego é o maior infortúnio, mas a situação dos trabalhadores informais é dramática e também se reflete nas vendas e nas perspectivas do varejo. Os desafios são evidentes e inegáveis, mas nenhuma perspectiva de melhora é oferecida pelo poder federal, empenhado na discussão da PEC dos Precatórios (ou do Calote) e na partilha fisiológica do Orçamento de 2022.

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Category: Blog

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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