O tamanho ideal do Estado

By | 26/12/2021 4:06 pm

Enquanto o País não repactuar as prioridades do Estado e suas condições operacionais, as reformas estarão fadadas ao fracasso ou à disfuncionalidade

A reforma tributária naufragou – de novo. A comissão mista que analisava uma reforma apta a melhorar o ambiente de negócios, estimular o crescimento e evitar aumentos da carga já fora esvaziada pelo governo em retaliação ao ex-presidente da Câmara e agora foi extinta pelo atual presidente (ver o editorial O fiasco da reforma tributária, de 6/12).

O malogro expõe, por óbvio, a incompetência e a mesquinhez do governo e de seus aliados fisiológicos no Congresso. Mas, além dessa conjuntura, ele expõe um profundo desafio estrutural: a compatibilidade entre os direitos cimentados na Constituição de 88 e seus mecanismos de sustentação. As melhores propostas tributárias estão destinadas à disfuncionalidade até que o País defina o tamanho do Estado – ou seja, as tarefas essenciais e condições operacionais – que ele quer.

O crescimento do Estado é uma constante global desde a substituição – ou melhor, a superposição – do Estado liberal do século 19 pelo Estado social do século 20. No século 21, a pressão de megatendências como o envelhecimento populacional ou as políticas climáticas deve ampliá-lo ainda mais. A questão é a quantidade e a qualidade desse crescimento.

O Estado brasileiro gasta muito, como provam os altos déficits fiscais e a trajetória insustentável da dívida pública. Mas, acima de tudo, gasta mal. Que a maior parte das despesas – que só cresceram nas últimas décadas – é ineficiente e regressiva comprova-se na insatisfação generalizada com os serviços básicos, como saúde, educação, segurança ou infraestrutura. O problema não é tanto que o Estado seja grande, mas sim balofo.

Precisamente para garantir a sustentação e a expansão dos gastos produtivos, é preciso eliminar os gastos ineficientes e distorcivos com burocracias obsoletas, estatais desnecessárias, regulações que travam a competição, subsídios e incentivos ineficazes e todo o tipo de privilégio corporativo. Ou seja, não se trata tanto de reduzir o tamanho do Estado, mas de torná-lo ágil, vigoroso e sustentável. O governo FHC, por exemplo, reduziu a participação do Estado em diversos setores da economia, mas aumentou a carga tributária de 26% para 32%.

Um estudo do Banco Mundial sobre a eficiência e a equidade do gasto público no Brasil (Um Ajuste Justo) estima que o País poderia resgatar pelo menos 7% do PIB com modernizações na Previdência; adequação dos salários e prêmios do funcionalismo aos valores da iniciativa privada; melhores métodos de aquisições públicas; corte de subsídios e incentivos que não geram empregos, inovação ou produtividade; racionalização e focalização dos programas sociais; fim de créditos tributários para despesas privadas com saúde; mais eficiência nas despesas com o ensino fundamental; e reformas das despesas altamente regressivas com o ensino superior.

Tais mudanças precisariam ser alicerçadas por ajustes nas rígidas regras orçamentárias; a institucionalização de um sistema rigoroso de monitoramento e avaliação das políticas públicas; a simplificação radical do sistema tributário; e a transferência de parte da carga tributária sobre o consumo e produção para impostos sobre renda e patrimônio.

Desde a Constituição dita “cidadã”, os gastos públicos cresceram expressivamente. No entanto, o Brasil ainda é um dos países mais desiguais do mundo e há décadas a renda per capita parou de se aproximar da dos países desenvolvidos. Reformas liberalizantes, como a abertura comercial, a modernização da legislação trabalhista ou as privatizações, são necessárias. Mas elas não são incompatíveis com a melhoria e mesmo a ampliação do Estado de Bem-Estar Social. O genuíno liberalismo, ao contrário, sabe que a garantia de direitos básicos é a condição para que todos possam exercer sua liberdade. Mas a condição para que o Estado possa conferir essas garantias é que ele não consuma todos os recursos públicos consigo mesmo.

O que os eleitores esperam dos candidatos em 2022 não é que se proponham a cortar na carne do Estado, mas em sua gordura. Ou, melhor ainda, transformar a gordura em musculatura.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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