Bem que alguns ministros queriam tirar o protagonismo do Supremo no ano eleitoral, mas a realidade não permite. Tão vilipendiada nestes novos tempos, ela, a realidade, perde daqui e dali para as fake news, mas, no geral, ainda se sobrepõe às vontades e maquinações.
A nova crise com o Planalto é pelo “direito ao silêncio” do presidente Jair Bolsonaro sobre o vazamento ilegal de um processo sigiloso da Polícia Federal, mas não é única. A pauta do Supremo é recheada de temas ligados direta ou indiretamente a Bolsonaro.
São cinco inquéritos contra ele: vazamento ilegal do inquérito da PF, prevaricação nas vacinas da Covaxin, ataques às urnas eletrônicas, fake news associando vacinas contra a covid à aids e o primeiro deles, por interferência política na PF. São graves, mas não devem dar em nada, porque a eleição está bem aí à frente e o Supremo não vai incendiar o País, com economia patinando e miséria grassando.
Há ainda casos que envolvem interesses conflitantes do governo, da sociedade e do País, como o marco regulatório das terras indígenas, a ferrovia Ferrogrão e as rachadinhas – o alvo é outro, mas qualquer decisão resvalará para o 01, senador Flávio Bolsonaro.
E há uma sucessão de provocações de Bolsonaro para cutucar adversários, jogar governadores, prefeitos e os próprios ministros do STF contra a parede e só ele se dar bem. Esse jogo de xadrez não sai da cabeça de Bolsonaro, mas de filhos e articuladores de fake news, ataques baixos e contrainformação. Tudo bem calculado e amplificado pelas redes bolsonaristas.
Exemplo fresquinho e didático: Bolsonaro, que se esbaldou de jet ski enquanto a Bahia afundava em tragédia, anunciou ontem que visitará São Paulo. A armadilha é que João Doria e os críticos do presidente não podem elogiar nem condenar. Seria fazer o jogo dele em qualquer hipótese.
Bolsonaro nunca tem nada a ver com preços, tragédias, crise social, ambiental, da educação, da saúde… Joga sempre para governadores, adversários, mídia, Supremo. Ele fez tudo errado na pandemia? A culpa é deles. Denunciou a urna eletrônica? Eles reagiram. Lutou pelo marco temporal? Eles vetam.
Bolsonaro teve de recuar da intervenção nos preços da Petrobras e pôs a culpa no ICMS, logo, nos governadores. E, depois de jogar a bomba dos 33,24% no piso salarial dos professores, diverte-se com a reação de governadores e prefeitos e a saia-justa do Supremo. Todo mundo defende os professores, mas sem explodir as contas públicas. Bolsonaro cria o problema, a Federação e as instituições que se virem para consertar e explicar o óbvio.