Política como negócio familiar (com comentário)

By | 28/02/2022 3:46 pm

Força do clã Tatto na capital paulista mostra que a exploração da política como negócio de família não tem contornos ideológicos

(Editorial dO Estadão, 28 de fevereiro de 2022, seguido de comentário nosso)

Uma recente reportagem do Estadão mostrou o tamanho do domínio do clã Tatto, vinculado ao PT, sobre uma grande área da zona sul da cidade de São Paulo – que há muito tempo é conhecida como “Tattolândia”. O que chama a atenção, além da extensão do controle dos Tattos na região, é o fato de que a exploração da política eleitoral como um empreendimento familiar no Brasil não tem contornos partidários ou ideológicos.

O presidente Jair Bolsonaro (PL), por exemplo, já chegou a afirmar que seu grande objetivo político era “sarneyzar o Rio de Janeiro”, aludindo ao domínio que o clã Sarney, vinculado ao MDB, exerceu sobre o Maranhão ao longo de décadas. É discutível se Bolsonaro, de fato, logrou “sarneyzar” o Rio, mas o fato é que construiu no Estado não só a sua própria carreira política, como fabricou a de seus dois filhos mais velhos, Flávio e Carlos Bolsonaro. Já Eduardo Bolsonaro, vulgo “03”, veio para São Paulo, onde conseguiu se eleger deputado federal também pela força do sobrenome. O outro filho homem do presidente, Jair Renan, também demonstrou ter pretensões eleitorais, com estímulo do pai orgulhoso.

Essencialmente, a visão dos Tattos e dos Bolsonaros sobre a presença da família na política não é diferente da visão dos Garotinhos. Liderado pelo casal Anthony e Rosinha Garotinho, o clã já transitou por partidos de diferentes colorações ideológicas, mas nunca deixou de dominar a política no norte fluminense. Uma filha do casal, Clarissa Garotinho (PROS-RJ), é deputada federal. Um filho, Wladimir Garotinho (PSD), é o atual prefeito de Campos dos Goytacazes, base eleitoral do clã. De lá, Anthony e Rosinha pavimentaram o caminho até o Palácio Guanabara, de onde ambos saíram para a cadeia. Mas isso é outra história.

Não surpreende que a exploração da política eleitoral como uma empreitada familiar não apresente recortes partidários ou ideológicos. A bem da verdade, para os que se beneficiam dessa prática tão arraigada no País, nem haveria de apresentar mesmo. Afinal, o que une Tattos, Bolsonaros, Sarneys e Garotinhos, entre outras famílias com muitos mandatários entre os seus, é justamente a ideia de que os interesses familiares sempre se sobrepõem aos interesses públicos mediados pela política, esta sim, por excelência orientada por premissas partidárias e ideológicas, e não por laços de consanguinidade. Em outras palavras: quando os objetivos privados de uma determinada família fortemente presente na política, seja qual for a coloração partidária, colidem com os objetivos gerais da sociedade, tanto pior para a coletividade.

Jilmar Tatto, o mais proeminente membro do clã Tatto, atual secretário nacional de Comunicação do PT e figura de destaque nas pré-campanhas do ex-prefeito Fernando Haddad ao governo de São Paulo e Lula da Silva à Presidência da República, pretende ser candidato a deputado federal nas eleições de outubro. Seus irmãos Enio e Nilto tentarão a reeleição para a Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) e para a Câmara dos Deputados, respectivamente. Enio está no sexto mandato. Nilto, no segundo. Outros dois irmãos Tatto, Arselino e Jair, são vereadores na capital paulista.

Mesmo diante dessa forte presença da família Tatto na política eleitoral – membros da família estão nas três esferas do Poder Legislativo –, Jilmar afirmou ao Estadão que o envolvimento dos irmãos na política “não é um projeto pessoal” de cada membro da família, mas sim um “projeto coletivo”. De fato, vê-se que é. Só faltou dizer a serviço de quem.

É de justiça reconhecer que nenhum dos irmãos Tatto, assim como ninguém dos clãs Bolsonaro, Garotinho, Sarney ou de qualquer outro clã presente na política brasileira, tomou à força o mandato que exerce. Foram todos eleitos de acordo com as leis em vigor. Por isso, é de fundamental importância a participação dos eleitores para a construção de um quadro de representação política mais arejado e, principalmente, mais infenso à contaminação da política por interesses de natureza privada.

Toda eleição é uma oportunidade para que cada cidadão reflita sobre suas escolhas e, na medida de sua responsabilidade, contribua para o amadurecimento da democracia representativa no País.

Nossa opinião

Para quem pensa que a politica como negócio familiar é exclusividade do Nordeste, ou das regiões mais pobres do pais, onde as pessoas vivem de favores. Ela existe no Maranhão pobre onde os Sarney reinaram e existe no Estado de São Paulo, o mais rico da federação. Mas é claro que lá como cá,  são as classes pobres que servem de munição para estes políticos. Em quase cada toda cidade da Paraíba reinam uma ou duas famílias, sendo uma exceção talvez a capital, onde algumas lideranças comandam, mas nem sempre as suas famílias. Em Campina Grande reinam os Cunha Lima, os Vital do Rego, os Ribeiro. Em Patos os Motta e os Wanderley, em Santa Luzia  e São Mamede os Morais, em Sousa os Gadelha e assim por diante. Os Tota já mandaram em Mãe Dágua, os Motta mandam no Bonfim, em Maturéia os Dantas, os Mineral em Areia de Baraúna, e vão por aí afora. (LGLM)

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Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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