O governo Bolsonaro empenha-se na produção de casos de mau uso de dinheiro público, como na Educação, e demonstra notável eficiência para proteger o presidente
As “escolas fake” são a mais perfeita tradução de um governo igualmente “fake”. Quase nada do que foi prometido na campanha que elegeu Jair Bolsonaro para a Presidência em 2018 saiu do papel, das reformas às privatizações. Mas, agora está claro, não é só incompetência; é vocação: o governo de Bolsonaro está estruturado para atender aos interesses do Centrão, que, em troca, mantém o presidente no poder, a despeito das inúmeras razões para seu impeachment. E agora, em ano eleitoral, essa mesma máquina funciona freneticamente para conquistar votos, para o presidente e para os parasitas que se associaram a ele na tarefa de se apropriar do Estado para a satisfação de seus objetivos privados.
Se o governo é “fake”, a corrupção, no entanto, é bem real. A manipulação obscura do Orçamento talvez seja o caso mais grave, já que esconde dos cidadãos os critérios de distribuição de recursos públicos. Mas está longe de ser o único.
Durante a pandemia de covid-19, por exemplo, o País, já indignado com a incompetência do governo para lidar com a crise, soube, estupefato, que integrantes do Ministério da Saúde tentaram negociar a compra de vacinas fora do horário de expediente e num shopping de Brasília. Agora, é o Ministério da Educação que se tornou uma usina de escândalos, que se juntam ao aparelhamento ideológico promovido pelo bolsonarismo. Ao longo de toda a pandemia, o governo federal cruzou os braços para a situação do ensino e dos estudantes, mas se mostrou muito eficiente na produção de casos de mau uso do dinheiro público.
Antes das “escolas fake”, o Estadão havia revelado que, mesmo depois de advertido por órgãos de controle, o MEC, num processo de compra de ônibus escolares, seguia oferecendo até R$ 480 mil por unidade que valia, no máximo, R$ 270 mil. O edital foi ajustado só depois que o caso veio à tona. Houve também o caso, revelado pelo jornal Folha de S.Paulo, da compra de kits de robótica com sobrepreço para escolas sem água encanada. Não tinha infraestrutura mínima, não tinha prioridade no ensino, mas tinha superfaturamento.
Até o momento, o Palácio do Planalto dá sinais de que não está preocupado em sanear os processos do MEC ou de qualquer outro órgão do governo. Empenha-se apenas em impedir – todos os seus movimentos se orientam neste sentido – que as investigações sobre os escândalos avancem.
Bastou a movimentação de alguns senadores para viabilizar a instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre os casos escabrosos do MEC – medida de elementar prudência perante tantos casos de mau uso dos recursos públicos – para que o governo rápida e eficientemente agisse para demover alguns parlamentares. Ou seja, o governo que passou todo o mandato de Bolsonaro demonstrando cavalar incompetência na articulação com o Congresso para aprovar reformas exibe agora inaudita eficiência para impedir que uma nova CPI fustigue o governo, algo delicado especialmente em ano eleitoral.
A repentina diligência do Palácio do Planalto gerou resultado imediato. Na sexta-feira passada, os senadores Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), Styvenson Valentim (Podemos-AC) e Weverton Rocha (PDT-MA) retiraram seu apoio para abertura da CPI da Educação. Uma vez que os indícios de corrupção no MEC só aumentam, não se sabe se o governo conseguirá de fato barrar a investigação do Congresso. De toda forma, uma coisa é inegável: quando o objetivo é proteger o presidente, escamoteando a incompetência administrativa, a obscura manipulação do Orçamento e os negócios esquisitos conduzidos pelos operadores do governo, a gestão Bolsonaro adquire uma espantosa vitalidade.