Bolsonaro, Lira e a política do grito no caso Petrobrás

By | 18/06/2022 5:02 am

Ataques violentos do governo e seus aliados aos executivos da Petrobras não têm outro objetivo senão o de fazer da estatal o bode expiatório da inflação

A virulenta reação do presidente Jair Bolsonaro e de seus aliados no Congresso ao reajuste dos combustíveis anunciado pela Petrobras é despropositada sob qualquer aspecto que se observe – menos, é claro, o eleitoral.

Há 99 dias segurando os preços da gasolina, mesmo diante da forte alta no mercado internacional, a companhia anunciou um aumento de 5,2%. Para o diesel, congelado há 39 dias, o reajuste foi de 14,2%. Nos dois casos, os índices foram inferiores ao necessário para alinhar os preços internos aos praticados no exterior.

Do ponto de vista da estatal, era a coisa certa a fazer, pois, por determinação estatutária e legal, a empresa não pode deliberadamente represar seus preços se isso significar perdas aos acionistas – entre os quais, recorde-se, está a União, que é majoritária. Ademais, o adiamento do reajuste poderia levar a desabastecimento, uma vez que cerca de um terço do diesel consumido no Brasil é importado – e, por razões óbvias, os importadores se recusam a comprar combustível para vendê-lo com prejuízo no mercado interno.

Nenhum desses argumentos racionais, contudo, impediu a ofensiva de Bolsonaro e do presidente da Câmara, Arthur Lira, contra a Petrobras. O mais recente ataque começou na quinta-feira, quando o governo pressionou o Conselho de Administração a não aprovar o reajuste. Nesse mesmo dia, Bolsonaro disse que um aumento logo após a aprovação do teto do ICMS pelo Congresso – elaborado e aprovado a toque de caixa por irresistível pressão bolsonarista, a despeito dos imensos danos que causará aos Estados – não teria justificativa a não ser um “interesse político” para atingir o governo.

Ontem, numa interferência absolutamente descabida, Arthur Lira admitiu ter telefonado para o presidente da Petrobras, José Mauro Ferreira Coelho, para advogar contra o reajuste. Além disso, o presidente da Câmara cobrou a renúncia imediata de Ferreira Coelho: “Saia daí, saia já! Esse lugar não é seu. É do Brasil”, escreveu Lira no Twitter. O diversionismo chegou a ponto de incluir a ameaça de instauração de uma CPI para investigar os conselheiros e executivos da Petrobras – que, em um processo quase kafkiano, estão sendo acusados de fazer precisamente o trabalho para o qual foram contratados.

Na narrativa mambembe que o governo tenta emplacar, o motivo do mais novo aumento dos combustíveis seria uma “retaliação” de Ferreira Coelho e de membros do Conselho de Administração da Petrobras contra a decisão de Bolsonaro de substituí-los. No mundo real, contudo, as commodities minerais e agrícolas continuam a ser influenciadas pela guerra entre Rússia e Ucrânia, e o aumento dos preços dos combustíveis era mais do que previsível. Ademais, já se sabia que o teto para o ICMS seria meramente paliativo e provavelmente inútil, anulado à medida que novos reajustes fossem anunciados.

Nenhuma dessas considerações refreou o ímpeto demagógico de Bolsonaro e Arthur Lira, concentrados exclusivamente nas eleições de outubro. Pouco importa se isso significar a ruína da Petrobras, exatamente como aconteceu no desastroso governo de Dilma Rousseff, que, igualmente por imperativos eleitorais, impôs controle de preços sobre os combustíveis, causando rombo de mais de R$ 100 bilhões à estatal.

Em sua cruzada para segurar os preços dos combustíveis na esperança de conter a inflação, que ameaça lhe tirar a reeleição, Bolsonaro já demitiu três presidentes da Petrobras, trocou o ministro das Minas e Energia, mobilizou mundos e (principalmente) fundos para aprovar o teto do ICMS sobre combustíveis e agora quer uma CPI para intimidar os executivos da estatal.

Tudo isso tem sido em vão – e assim continuará a ser, salvo se forem alterados os estatutos e as leis criados justamente para impedir que a Petrobras volte a servir a um projeto de poder, como nos tempos do PT. Afinal, é improvável que algum executivo ou conselheiro da Petrobras em seu juízo perfeito se arrisque a ter problemas na Justiça por permitir que a empresa se dobre aos interesses de Bolsonaro e de seus sócios, causando prejuízo aos acionistas e ao País.

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Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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