O que um psicanalista diz sobre o silêncio de Bolsonaro

By | 22/12/2022 6:17 pm
(Thiago Herdy, Colunista do UOL, 22/12/2022)
 Bolsonaro chora durante evento das Forças Armadas - Reprodução/TV Brasil
Bolsonaro chora durante evento das Forças ArmadasImagem: Reprodução/TV Brasil
Passados 50 dias desde a derrota para Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o presidente Jair Bolsonaro segue desorientando aliados por conta da sua persistente reclusão no Palácio da Alvorada, negando-se a receber gente. Sua verborragia usual deu lugar ao silêncio.

Nos primeiros dias a postura foi atribuída a uma infecção na perna, mas ela já está praticamente curada e o recolhimento permanece.

“É uma postura estranha, uma incógnita para todo mundo. Não dá pra saber se ele está triste, se está bravo ou armando algo. A impressão que dá é a de que ele simplesmente jogou a toalha”, diz um ex-ministro.

Assista o documentário ‘As Vozes de Bolsonaro’ no Youtube de MOV.doc

 

Aliados se preocupam com o presente e também o futuro: o papel da costura política e o trabalho estratégico de organização política nos bastidores não parece mesmo ser o forte do presidente, que a partir de 1º de janeiro estará pela primeira vez, em 34 anos, sem mandato.

Se quem está perto não entende o que acontece na cabeça do presidente, o jeito é recorrer aos especialistas. Quem sabe a psicanálise não sugere alguma resposta?

Desde o surgimento do fenômeno Bolsonaro nas eleições de 2018, o psicanalista e professor da USP Christian Dunker dedica parte do seu tempo a analisar o discurso e a postura pública do presidente. Nunca o teve presencialmente no divã, mas ainda assim se arrisca a formular algumas hipóteses sobre seu comportamento em final de mandato.

“Ao longo dos últimos anos, muitos entendiam Bolsonaro como sujeito perverso, manipulador, mas o que a gente via é que na verdade se tratava de uma pessoa frágil, muito limitada. A hipertrofia da masculinidade e o exibicionismo de virilidade no fundo denotavam um sentimento de inferioridade, de alguém não tão confortável com a própria condição de presidente”, diz Dunker ao iniciar sua análise.

Ele continua:

“O presidente nunca esteve confortável com a separação entre comportamento público e privado que se exige de um político. Essa fraqueza sempre foi também uma parte de sua força, ao criar efeito de estar sempre pessoalmente atingido, e por isso falando mais próximo das pessoas”.

O psicanalista lembra que a impossibilidade de voltar atrás ou admitir erro é uma característica do bolsonarismo, em especial do movimento social que o apoia. O ponto de dúvida é “estruturalmente afastado”.

Portanto, a vitória nas urnas era uma convicção, não apenas uma torcida.

“Em um sistema de crenças, é como se fosse parte do destino. Quando este sistema se confronta com a realidade, ou você tem uma correção delirante (caso do manifestante que se agarra ao vidro do caminhão) ou uma espécie de catástrofe subjetiva. ‘Isso que não consegui admitir ao longo da jornada – a possibilidade de derrota – agora me massacra, me destrói'”, simula Dunker.

O psicanalista considera a hipótese de o presidente estar vivendo um quadro de estupor – uma espécie de surpresa prolongada, que inativa o sujeito e parece deixá-lo preso ao momento do recebimento de uma má notícia.

“Aparentemente é o que ocorreu, um momento prolongado de irrealização subjetiva, de quem não é capaz de acreditar no que está acontecendo. É também o que explica os episódios de choro – você não consegue se controlar, mesmo estando em um evento público. É como se o presidente lesse no olho de cada um dos generais que ele fracassou”.

O risco deste tipo de paralisia é a geração de ações “destrutivas e impulsivas”, mas até aqui Bolsonaro optou por derrubar, em vez de insuflar, reações violentas dos descontentes com o resultado da eleição.

A celebração da família é a palavra de ordem bolsonarista. Dunker prevê tempo para Bolsonaro reencontrar “a palavra e seu discurso”. Até esse dia chegar, ele crê que a mensagem estará com seus filhos – e disponível nos canais de seus apoiadores digitais.

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Category: Blog

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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