Processo contra general expõe necessidade de vetar militares da ativa no governo
(Editorial da Folha, em 05/02/2023)
A Controladoria-Geral da União anunciou que irá analisar a quebra de sigilos impostos pelo governo Jair Bolsonaro (PL) a 234 processos, entre os quais o que envolve a transgressão disciplinar do general Eduardo Pazuello.
A indicação do oficial, então na ativa, para a pasta da Saúde durante a pandemia de Covid-19 foi um dos casos mais aberrantes da militarização da máquina governamental promovida pelo ex-presidente.
Depois de seguidas crises com a cúpula do ministério, o mandatário escalou o general para cumprir suas ordens, que contrariavam, como se sabe, recomendações sanitárias, propagavam mentiras sobre a doença e desacreditavam a eficácia da vacinação.
Após uma sequência de descalabros, o general deixou o Ministério da Saúde sob forte pressão de lideranças do chamado centrão, mas continuou na ativa e a serviço de Bolsonaro. Foi nessa condição que participou de um comício político no Rio de Janeiro em apoio à reeleição do então presidente.
Ao subir no palanque, Pazuello tornou-se alvo de um processo disciplinar do Exército, cujo código de conduta veta a participação de militares da ativa em atos político-partidários. Bolsonaro interveio e levou o Exército a impor sigilo sobre o processo, no qual o aliado escapou de punição.
A possível suspensão do segredo, por constrangedora que seja para setores da cúpula militar, ajudará a esclarecer o episódio, que além de suas particularidades suscita questões relevantes para o bom andamento da democracia.
A presença de militares da ativa em cargos da administração pública é uma insensatez que pode causar danos às Forças Armadas e gerar ruídos desnecessários no sistema democrático. Esta Folha tem defendido restrições legais rígidas a essa participação.
Em 2021, foi apresentada no Congresso uma proposta de emenda constitucional (PEC) que impede a nomeação de militares da ativa para funções governamentais. Não por acaso apelidada de PEC do Pazuello, a proposta, atualmente parada na Câmara, encontra, com a mudança de governo, condições mais favoráveis para prosperar.
Sua aprovação representaria, sem dúvida, aperfeiçoamento do arcabouço institucional brasileiro.