Celular de Ibaneis mostra por que foi afastado do Governo do DF e não pode voltar

By | 10/02/2023 8:25 am

(Reinaldo Azevedo, no blog 83Agora, em 10/02/2023)

Quando o ministro Alexandre de Moraes determinou o afastamento por 90 dias de Ibaneis Rocha (MDB), governador do Distrito Federal, houve muxoxo aqui e ali. Mormente porque o Ministério Público não havia feito tal pedido. Mais: argumentaram alguns que é o STJ, não o STF, o tribunal encarregado de processar governadores. Volto a esses pontos mais tarde.

Mensagens ao celular trocadas entre Ibaneis e autoridades de Brasília, extraídas pela Polícia Federal, evidenciam que a atuação do governador foi ainda mais deletéria do que se pensava. Repito o que afirmei no dia 8 de janeiro: deveria ter sido preso. Não foi. Mas fica evidente que não pode voltar ao cargo, Vamos ver.

Lembro que, na decisão em que afastou Ibaneis, Moraes escreveu:
“O descaso e conivência do ex-Ministro da Justiça e Segurança Pública e, até então, Secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, ANDERSON TORRES – cuja responsabilidade está sendo apurada em petição em separado – com qualquer planejamento que garantisse a segurança e a ordem no Distrito Federal, tanto do patrimônio público – CONGRESSO NACIONAL, PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA e SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – só não foi mais acintoso do que a conduta dolosamente omissiva do Governador do DF, IBANEIS ROCHA, que não só deu declarações públicas defendendo uma falsa ‘livre manifestação política em Brasília’ – mesmo sabedor por todas as redes que ataques as Instituições e seus membros seriam realizados – como também ignorou todos os apelos das autoridades para a realização de um plano de segurança semelhante aos realizados nos últimos dois anos em 7 de setembro, em especial, com a proibição de ingresso na esplanada dos Ministérios pelos criminosos terroristas; tendo liberado o amplo acesso.”

O despacho é do próprio dia 8, e ele foi afastado no dia seguinte. Convém que os inconformados comecem a perceber: Moraes sempre tem mais informações do que supõe o “antialexandrismo”. Notem ali que o ministro já destaca que Ibaneis “ignorou todos os apelos das autoridades” por um plano de segurança semelhante ao de 7 de setembro. Pois é.

PACHECO
No dia 7 de janeiro, antes do assalto aos Três Poderes, Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, enviou uma mensagem a Ibaneis Rocha. Dizia o seguinte:
“Estimado governador, boa noite! Polícia do Senado está um tanto apreensiva pelas notícias de mobilização e invasão ao Congresso. Pode nos ajudar nisso? Abraço fraterno. Rodrigo”.

Ao que Ibaneis respondeu:
“Já estamos mobilizados. Não teremos problemas. Coloquei todas as forças nas ruas.”

Como se sabe, é mentira que “todas as forças tenham saído” às ruas. Como lembrou Moraes, o governador se negou a montar uma operação especial, compatível com o risco, que era evidente.

FLÁVIO DINO
Às 21h11 do mesmo dia, Flávio Dino, ministro da Justiça, envia a Ibaneis um ofício solicitando que se impedisse a circulação dos ônibus de turismo nas imediações da Praça dos Três Poderes. À 0h28 já do dia 8, Dino manda outra mensagem com informação do site Metrópoles, segundo a qual o governador havia liberado as manifestações, sem quaisquer restrições, desde que pacíficas, claro!

O ministro quer saber:
“Governador, não entendi bem qual será a sua orientação para a Polícia do DF. Onde será o ponto de bloqueio e de que forma?”

E ficou no vácuo. O governador só respondeu no dia seguinte, poucas horas antes da manifestação, repassando mensagem de Fernando de Souza Oliveira, secretário de Segurança em exercício (Anderson Torres estava na Flórida…). Conteúdo:
“Público oriundo das caravanas em torno de 2.500 pessoas. Verificou-se chegada de mantimentos (alimentos, água, material de higiene) e instalação de diversas barracas de camping e lona. Situação tranquila, no momento.”

Ele repassa também uma mensagem de áudio que recebeu de Oliveira:
“Eu passei na Esplanada e na área central ali e está tudo muito tranquilo, tudo sossegado.”

Novo áudio do secretário de Segurança em exercício, às 14h30:
“Informe do meio-dia Até agora nossa inteligência está monitorando e não há nenhum informe de questão de agressividade ligada a esse tipo de comportamento. Então esse é o último informe para o senhor. Tem aproximadamente 150 ônibus já no DF, mas todo mundo de forma ordeira e pacífica.”

Prestem atenção! Ele repassa às 14h30 um informe do meio-dia. Ainda que verdadeiro fosse, o tempo o tornava inútil.

SURREALISMO COM ROSA
Mas nada se equipara à reação de Ibaneis na conversa com Rosa Weber, presidente do Supremo.

Às 16h25, ela lhe escreve:
“Já entraram no Congresso”

Ele responde:
“Coloquei todas as forças de segurança nas ruas.”

Sabem o que o valente fez em seguida? Afirmou que estava cuidando do assunto e compartilhou com Rosa o telefone do secretário de Segurança em exercício. ISSO MESMO! Só faltou um “liga pra ele se quiser”.

Quando a canalha já depredava as respectivas sedes dos Três Poderes, aí o Ibaneis tranquilão enviou mensagem a Dino: “Vamos precisar do Exército.

Se aceita a sugestão, o governo Lula teria acabado ali. O “Plano Gold” do golpismo sempre foi este: desordem generalizada, Polícia Militar inerme ou conivente com os golpistas (vimos as duas coisas) e necessidade de intervenção das Forças Armadas.

AFASTAMENTO
Voltemos ao afastamento de Ibaneis.

Moraes justificou de maneira irrespondível o afastamento do governador. Transcrevo:
“Conforme prevê o Código de Processo Penal, somente será possível a imposição das medidas cautelares previstas no art. 319, desde que observados os critérios constantes do art. 282, que são: “necessidade” (necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais) e “adequação” (adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado).

Na presente hipótese, verifico haver necessidade de se impor medida cautelar diversa da prisão — uma vez que não houve representação da PF ou requerimento da PGR pela prisão preventiva — consistente na suspensão do exercício da função pública do agente público que teria tido, ao menos pelos elementos de prova inicialmente coligidos e amplamente divulgados, envolvimento com os fatos descritos, ainda que por omissão dolosa. Diversos e fortíssimos indícios apontam graves falhas na atuação dos órgãos de segurança pública do Distrito Federal, pelos quais é o responsável direto o Governador do Distrito Federal, IBANEIS ROCHA, dentre os quais é possível listar, até o momento, os seguintes fatos principais:
(a) os terroristas e criminosos foram escoltados por viaturas da Polícia Militar do Distrito Federal até os locais dos crimes;
(b) não foi apresentada, pela Polícia Militar do Distrito Federal, a resistência exigida para a gravidade da situação, havendo notícia, inclusive, de abandono dos postos por parte de alguns policiais;
(c) parte do efetivo deslocado para impedir a ocorrência de atos violentos não adotou as providências regulares próprias dos órgãos de segurança, tendo filmado, de forma jocosa e para entretenimento pessoal, os atos terroristas e criminosos;
(d) Anderson Gustavo Torres foi exonerado do cargo, no momento em que os atos terroristas ainda estavam ocorrendo.”

Notem: Ibaneis só não foi preso, depreende-se do despacho do ministro, porque não houve a solicitação do Ministério Público ou da Polícia. A situação do governador, parece-me, é insustentável. Ademais, é, sim, o STJ o foro para ações contra governadores. Acontece que o Inquérito 4.879, dos atos antidemocráticos — no âmbito do qual são investigados Ibaneis, Anderson Torres e outros — tramita no Supremo. Até porque a investigação de ataques ao tribunal sempre serão da competência do próprio tribunal.

A defesa de Ibaneis Rocha sustenta que o governador nem se omitiu nem agiu de modo a provocar os desastres do dia 8 de janeiro. O papel da defesa é mesmo defender e tem o meu respeito. Mas os fatos não endossam a versão.

Ibaneis até pode voltar ao cargo — já fez o pedido ao Supremo —, mas não parece plausível que escape de uma condenação.

 

 

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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