Caso da joias sauditas mostra que a Marinha tem um novo dever a cumprir (seguido de comentário nosso)

By | 15/03/2023 8:40 am

Extravagâncias de Garnier e comportamento de Bento na alfândega marcam a Força Naval durante o governo Bolsonaro; punido por criticar partidarização, almirante Nigro elogia fiscais da Receita

(Marcelo Godoy, colunista do Estadão, em 14/03/2023)

Foto do autor: Marcelo GodoyConta-se que, diante do inimigo, quando se aproximava do Riachuelo, o almirante Barroso transmitiu à frota uma mensagem: “O Brasil espera que cada um cumpra o seu dever”. Com esse espírito, Hélio Leôncio Martins, então capitão-tenente, subiu em um caça-ferro para proteger comboios no Atlântico Sul, na 2.ª Guerra. Ali testemunhou um submarino do Eixo explodir um petroleiro na costa venezuelana.

'Isso tudo vai entrar lá pra primeira-dama', disse Bento Albuquerque

'Isso tudo vai entrar lá pra primeira-dama', disse Bento Albuquerque
‘Isso tudo vai entrar lá pra primeira-dama’, disse Bento Albuquerque Foto: Reprodução/TV Globo

Mais tarde, o almirante Leôncio foi o primeiro comandante do porta-aviões Minas Gerais. Era sincero nas respostas. Ao ser indagado sobre se a Marinha estava preparada para o conflito, disse: “Zero… Pode pôr zero. Zero mesmo. Não sabíamos nada de defesa antissubmarina, não tínhamos arma, nem equipamentos”. O caça-ferro Juruena, com o qual fez a guerra, só foi incorporado à Marinha em novembro de 1942, três meses após iniciado o conflito. E foi no mar que o Brasil sofreu as maiores baixas – 1,5 mil mortos –, embora a memória lembre mais da perda dos cerca de 600 pracinhas e aviadores na Itália. “Cada passagem de comboio era uma vitória.” E Leôncio teve muitas. Morreu em 2016. Honrou cada sílaba da frase de Barroso.

A Marinha tem agora um novo dever a cumprir. Lidar com o papel de seus almirantes no governo de Jair Bolsonaro. Foi do comandante da Força, Almir Garnier, que surgiram duas extravagâncias: o desfile de carros de combate em Brasília, no dia da votação da PEC do Voto Impresso, e a ridícula recusa de transmitir o cargo ao almirante Marcos Olsen. Elas expuseram a politização na Marinha.

Já a revelação do caso das joias trazidas da Arábia Saudita para Bolsonaro e sua mulher, Michelle, por outro almirante – Bento Albuquerque – só atesta a degradação que o bolsonarismo impôs ao País. Em uma das andanças, Bento esbarrou em um fiscal que cumpria o seu dever.

Pior. A voz do almirantado que se insurgiu contra a partidarização da Força Naval, o contra-almirante da reserva Antonio Nigro, foi punido com uma repreensão, em 2022. E isso em um governo que abafou o caso do general da ativa Pazuello. Se há punições que têm o valor de uma medalha, Nigro teve a sua.

Recentemente, ele escreveu: “Não me surpreende o fato de Bolsonaro ter incorporado ao seu acervo pessoal parte dos presentes. Nem tampouco o protagonismo de militares partidarizados na façanha de omitir o desvio das joias. Louvável a dignidade da conduta dos agentes de carreira da Receita. Exemplar a resistência deles contra investidas de autoridades de mais elevado nível hierárquico.” Nigro tem razão. Sua fala não tem nada de ofensiva, só reconhece na conduta do fiscal o mesmo material que moveu Barroso e Leôncio: o cumprimento do dever.
Comentário nosso

Graças a Deus,  ainda há gente decente neste país.  Senão estaríamos a meio caminho do inferno. A passagem de Bolsonaro pelo governo foi traumatizante. Mas as esperanças renasceram com a sua derrota, na tentativa de reeleição. Esperamos que Lula e seus companheiros, além da turma do Centrão não nos decepcione.  (LGLM)

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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