Alta do número de idosos em planos de saúde, constatada pela ANS, ameaça o modelo de negócios e cria pressão sobre o SUS; é dever do País cuidar da dignidade dessa população
A pedido deste jornal, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) fez um levantamento que revelou que o número de jovens (20 a 39 anos) que utilizam planos de saúde no País caiu 7,6% entre 2013 e 2023, enquanto o de idosos (60 anos ou mais) cresceu 32,6% no mesmo período. Entre estes, houve um aumento de 41,9% dos usuários na faixa de 70 a 74 anos e de 39,5% na faixa de 80 anos ou mais. Some-se a isso o salto no número nos pedidos de reembolso, como também mostrou o Estadão, e se vê que não há como as empresas manterem suas contas no azul sem aumentar as mensalidades dos planos de saúde.
Se a transformação no perfil etário dos usuários de planos de saúde e as fraudes representam enorme risco para o equilíbrio financeiro das empresas, ainda mais preocupante é o transbordamento desse desarranjo econômico-empresarial para a sustentabilidade do Sistema Único de Saúde (SUS) num futuro muito próximo. Além de estar há décadas subfinanciado e de ter sido submetido a seu maior teste de estresse durante a pandemia de covid-19, o SUS está na iminência de ter de suportar um aumento significativo na demanda por seus serviços.
É consensual entre os especialistas do setor de saúde suplementar o diagnóstico segundo o qual, a serem mantidas as condições atuais, não tardará até que os planos de saúde sejam considerados “artigos de luxo” para os idosos no Brasil. A bem da verdade, ter um plano de saúde já é algo inalcançável para a esmagadora maioria da população. Basta dizer que 8 em cada 10 brasileiros acorrem ao SUS hoje quando precisam de atendimento médico, dos procedimentos mais simples aos mais complexos. A tendência é esse número aumentar no curto prazo.
Historicamente, os beneficiários mais jovens, em geral mais saudáveis, sempre contribuíram para o equilíbrio financeiro das empresas de saúde suplementar. Os mais idosos, por sua vez, quando precisam de atendimento médico, não raro demandam serviços mais complexos – portanto, mais caros. Não é preciso ser um ás da contabilidade para perceber que esse modelo de negócios está com os dias contados. Cada vez mais idosos, sem condições financeiras para arcar com a mensalidade de planos de saúde cada vez mais caros, baterão às portas do SUS em busca de atendimentos cada vez mais especializados e onerosos.
Diante desse cenário desafiador, é fundamental que a sociedade, por meio de seus representantes, reflita sobre o papel do SUS como viabilizador de um imperativo constitucional: o acesso à saúde. É o caso de lembrar que o legislador constituinte tratou a saúde como “um direito de todos e um dever do Estado”. Olhar com o devido cuidado para as necessidades do SUS é, antes de tudo, cumprir o que determina a Constituição. Houve tentativas no Congresso de repensar o modelo de financiamento e dotar o SUS, um patrimônio nacional, de condições materiais e humanas para seguir prestando serviços relevantíssimos à sociedade. Esse movimento, infelizmente, parece ter sido deixado para trás.
O envelhecimento da população não deve ser encarado como um estorvo. É antes algo a ser celebrado. Entretanto, para aproveitar plenamente os benefícios desse processo, é essencial que o Estado, a iniciativa privada e a sociedade em geral atuem de forma conjunta, buscando soluções que garantam uma assistência digna e de qualidade aos idosos. O desafio é grande, mas com um compromisso coletivo, o País tem todas as condições de construir um futuro mais saudável e inclusivo para todos.
Comentário nosso
Os Planos de Saúde estão ficando proibitivos para idosos. Uma amigo meu paga mensalmente um plano de saúde para a ex-mulher, com pouco mais de setenta anos de idade, no valor de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais). Ou seja, para quem tiver uma renda de R$ 10.000,00 isto representa 25% (vinte e cinco por cento). (LGLM)