(Luiz Gonzaga Lima de Morais, jornalista e funcionário público federal)
Esta matéria é de vinte anos atrás (escrita em 12/08/2003) mas permanece atual. Hoje não caberia no Papo de Coleguinha, por muito longa.
Os prefeitos brasileiros de um modo geral andaram se insurgindo contra a recente redução do Fundo de Participação dos Municípios, o chamado FPM. As perdas do FPM são muito mais sentidas nos municípios do Nordeste, justamente porque este fundo constitui praticamente a única fonte de recursos da maioria dos municípios. Com exceção daqueles municípios que são produtores de matérias primárias ou que têm fábricas, pois dispõem de um substancial ICMS, todos os demais sobrevivem, quase que exclusivamente, das três quotas decendiais do FPM. Com elas pagam salários, atendem os compromissos com os fornecedores e, se sobra alguma coisa, eles fazem algum investimento. Como a maioria têm folhas de pagamento que encostam nos limites impostos pela lei de responsabilidade fiscal, fica muito pouco para investir. Para conseguir fazer alguma coisa pelo município, os prefeitos vivem de pires na mão perambulando pelos corredores dos ministérios em Brasília. E quem não fizer isto ou não tiver um deputado federal que se interesse para incluir o seu município nas verbas orçamentárias está “ferrado”. Por isso a grita contra o recuo das parcelas do FPM.
Mas por que uns prefeitos reclamam mais do que os outros? Há algum tempo nos contaram a história acontecida em uma reunião de prefeitos. Numa roda todos reclamavam por que os recursos de que dispunham eram poucos e que por isso não podiam fazer nada. Um deles, entretanto, tomou a palavra e perguntou aos demais: Quem de vocês quer me arrendar a sua prefeitura? Ninguém topou a proposta. O pretenso arrendatário sabia do que estava falando. Prefeito com vários mandatos, ele tem uma das prefeituras mais bem administradas da região e paga sempre em dia, tanto aos funcionários como aos fornecedores. Se dá para ele, por que não dá também para os outros?
A diferença está justamente na capacidade administrativa e na causa que motiva cada prefeito. Há prefeitos que visam o bem da sua comunidade, há prefeitos que visam a próxima eleição, há prefeitos que visam o enriquecimento pessoal ou dos parentes e amigos. Embora os que visem a próxima eleição possam atingir seu objetivo fazendo uma boa administração, a maioria visa no empreguismo ou no favor pessoal atrair e manter os seus eleitores. Os bons administradores e que visam o bem da comunidade procuram se organizar de acordo com a capacidade de arrecadação do seu município. Estão atentos para fenômenos como o que está acontecendo este ano. Tomaram conhecimento de que o aumento da arrecadação de 2002 era atípico e poderia não se repetir em 2003, como de fato não aconteceu. E ficaram atentos às oscilações que a crise econômica podia provocar. Estes não foram tomados de surpresa. Qualquer contador de prefeitura sabe de cor e salteado quais são os meses de aumento e de queda do FPM.
Mas existem aqueles que ou herdaram uma folha de pagamento inchada ou incharam eles próprios a folha de pagamento de sua prefeitura. Sabem que o caminho natural seria cortar da folha os funcionários desnecessários, mas temem perder votos. Os bons administradores mantêm as suas folhas enxutas e com isso sobra alguma coisa para investir ou para enfrentar as quedas de arrecadação.
Alguém, certamente, vai argumentar que, em cidades pobres como as nossas, as prefeituras têm que empregar muita gente e que dispensar funcionários vai criar um problema social. Mas esquecem que, ao não pagar aos seus fornecedores, vão criar também um problema social, com a desestruturação do setor produtivo de sua região. E que o dinheiro investido em melhoramentos para a cidade e no incentivo ao comércio e à indústria vai trazer resultados muitos mais permanentes do que o magro salário pago aos funcionários temporários. Para o município talvez seja mais produtivo distribuir cestas básicas formadas com produtos adquiridos no município do que pagar o magro salário dos empregados irregulares. A cesta básica vai ativar a economia do município.
Com relação aos que só pensam em vantagens pessoais para si e seus amigos não há o que sugerir. Certamente vão gozar dos que lembram que a prefeitura não é deles. Mas poderiam pelo menos se lembrarem que, se bem administrada durante quatro anos, uma prefeitura por pequena que seja, poder render muitas sobras. A menor prefeitura, em quatro anos, tem uma receita de pelo menos cinco milhões de reais. O problema é que, segundo um prefeito experiente, muitos querem “comer pelo pé”. Mas, segundo aquele mesmo prefeito, quanto mais um prefeito faz, mais pode sobrar.
Nós já dissemos em nossos programas de rádio. O Fundo de Participação dos Municípios continua a ser formado por 22,5% de toda arrecadação do Imposto de Renda e do Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI). O governo Lula não mexeu nestes percentuais que são previstos no artigo 159, inciso I, “b”, da Constituição Federal. Claro que a crise econômica deste princípio de governo pode ter diminuído a arrecadação destes dois impostos. Mas é uma situação que esperamos será superada em breve. A redução, entretanto, tem servido para que muitos prefeitos apresentem como desculpa para o não cumprimento dos compromissos assumidos com eleitores e credores.
Os bons administradores sabem vencer problemas desta natureza, usando a criatividade e a competência. Os maus administradores, que vivem empurrando os problemas com a barriga, a esses só resta reclamar do governo e ameaçar com caravanas a Brasília. A crise existe, mas é nessas horas que o bom administrador mostra competência.