Tribunal Superior Eleitoral condenou ex-presidente e seu vice por abusos e conduta vedada nas comemorações do Dia da Independência em 2022
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Blog do Fausto Macedo no Estadão, em 31/10/2023)O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) novamente à inelegibilidade nesta terça-feira, 31. O placar foi de 5 a 2. Os ministros também impuseram multa no valor de R$ 425 mil.
Desta vez, o general Walter Braga Netto, vice na chapa, que foi poupado nos primeiros julgamentos no TSE, também foi declarado inelegível.
É a terceira leva de processos contra Bolsonaro julgada no Tribunal Superior Eleitoral. O ex-presidente já foi condenado e declarado inelegível por atacar as urnas eletrônicas e o sistema eleitoral. Bolsonaro foi absolvido em um segundo bloco de ações, sob acusação de usar o cargo para fazer campanha na eleição de 2022. Ele ainda é alvo de outros nove processos.
A nova condenação não afetará concretamente o destino político do ex-presidente. As penas, nesse caso, não se somam. Os direitos políticos do ex-presidente estão suspensos pelo período de oito anos. O prazo começa a contar a partir da última eleição.
O que dizem as ações?
As ações relacionadas ao 7 de setembro foram movidas pelo PDT e pela senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS). Bolsonaro foi acusado de usar cerimônias oficiais do bicentenário da Independência, em Brasília e no Rio de Janeiro, como palanque eleitoral.
Na parte da tarde, viajou para o Rio em avião da Força Aérea Brasileira (FAB), seguiu em uma motociata até o Forte de Copacabana, onde assistiu salto de paraquedistas, salva de tiros e manobra de aviões. O ex-presidente caminhou então até um trio elétrico, custeado pelo pastor Silas Malafaia, e discursou em um palanque na orla.
Como votou cada ministro
A favor das condenações
A votação teve início com o voto do ministro Benedito Gonçalves, corregedor da Justiça Eleitoral, que é o relator dos processos. Ele defendeu a condenação de Bolsonaro à inelegibilidade, pelo prazo de oito anos, por usar o bicentenário da Independência para promover sua candidatura à reeleição.
“O objetivo não precisou ser explicitamente anunciado, já que foi comunicado por símbolos potentes: patriotismo, demonstração ostensiva do poder militar, defesa da liberdade”, afirmou Benedito Gonçalves.
O ministro listou uma série de condutas que, em sua avaliação, mostram que Bolsonaro tentou explorar as comemorações cívicas na campanha. Ele argumentou, por exemplo, que o ex-presidente convocou eleitores e apoiadores para saírem às ruas na data e que organizou comícios a poucos metros dos eventos oficiais.
“A militância convocada para a celebração recebeu como derradeira missão mostrar a força da candidatura dos investigados, em uma luta do bem contra o mal”, seguiu o relator. “Houve, de forma inequívoca um sequenciamento entre atos oficiais e eleitorais.”
Ele também lembrou que o empresário Luciano Hang, dono da rede de lojas Havan, acompanhou Bolsonaro na tribuna de honra do desfile cívico-militar na Esplanada dos Ministérios e depois no comício. O empresário não tinha cargo público e foi um dos principais cabos eleitorais do ex-presidente.
Outro ponto destacado no voto é que o governo autorizou uma comitiva de tratores do Movimento Brasil Verde, que custeou eventos da campanha bolsonarista, a participar do desfile em Brasília.
O ministro ainda destacou que as comemorações do 7 de setembro no Rio, tradicionalmente organizadas na avenida Presidente Vargas, no centro da cidade, foram movidas para a orla de Copacabana, reduto de manifestações bolsonaristas.
“É fato notório que a orla de Copacabana se tornou, desde as eleições de 2018, local de concentração dos apoiadores do primeiro investigado. Juntando esse fator ao patriotismo militarizado que o candidato estimulou desde então não há como negar a relevância simbólica de levar a parada militar para ponto de encontro de sua militância. A mudança, portanto, era repleta de significado”, argumentou.
“Na tentativa pictórica de demarcar a separação, com a burlesca retirada da faixa presidencial, longe de demarcar a separação, apenas se ilustra que o candidato sabia do contexto emaranhado dos dois momentos e a tentativa de forçar uma linha divisória que, na prática, nunca existiu”, defendeu. “Os comícios não tiveram nada de ocasionais, foram ardilosamente convocados e combinados para fazer uso dos eventos públicos.”
O ministro André Ramos Tavares, que abriu o terceiro dia de julgamento, também votou para condenar o ex-presidente e seu vice. Ele defendeu que as cerimônias oficiais serviram como “chamariz” para os eventos de campanha e que, além de Bolsonaro, Braga Netto também participou dos comícios e se beneficiou deles.
“Houve uma ação coordenada no tempo que não pode ser ignorada. Desde a concepção, já ao convocar a população por intermédio das redes sociais e outros canais de comunicação, a data comemorativa era visada em prol da campanha eleitoral”, disse.
A ministra Cármen Lúcia afirmou que houve uma apropriação dos símbolos do Dia da Independência. Ela também destacou que os eventos foram planejados com antecedência e que Bolsonaro, em julho de 2022, em convenções eleitorais do PL e do Republicanos, pediu que seus apoiadores participassem das comemorações de 7 de setembro.
A ministra disse ainda que, em sua avaliação, a participação de Braga Netto não foi secundária. “A recandidatura impõe dificuldades, mas elas têm que ser superadas com a observância estrita da legislação. A República impõe respeito, exige austeridade, impõe responsabilidade e muita prudência”, criticou.
O último a votar foi o ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE, que lembrou os compromissos assumidos quando tomou posse no cargo. Na ocasião, Moraes prometeu penas duras e céleres para abusos dos candidatos nas eleições de 2022. “A Justiça pode ser cega, mas a Justiça não é tola”, afirmou. “As condutas são flagrantes. Houve uma verdeira fusão entre o ato oficial e o ato eleitoral. O abuso é claro.”
Contra a inelegibilidade de Bolsonaro e Braga Netto
O ministro Raul Araújo, por sua vez, defendeu a absolvição de Bolsonaro e Braga Netto. Ele afirmou que os eventos foram autônomos e ”facilmente distinguíveis”. Também argumentou que a legislação eleitoral não proíbe atos de campanha em locais públicos próximo a cerimônias oficiais.
“É público e notório que a temática envolvendo os valores e princípios regentes das Forças Armadas sempre foi mote da campanha de Jair Bolsonaro, de modo que não causa estranheza a realização dos atos de campanha pelo referido investigado”, disse.
O ministro Kassio Nunes Marques, indicado por Bolsonaro, manteve o ciclo de fidelidade ao ex-presidente, que o indicou para o cargo. Ele propôs multa de R$ 40 mil para Bolsonaro, sem inelegibilidade, e a absolvição de Braga Netto.