Bets são exemplo de doença social oportunista no Brasil

By | 03/10/2024 7:11 am

Corrupção e vícios constituem ameaça permanente em países com fragilidades institucionais

 

(Everardo Maciel, Consultor tributário, secretário da Receita Federal (1995-2002), no Estadão, em 02/10/2024)

Foto do author Everardo  MacielMédicos dizem que as infecções oportunistas são causadas por microrganismos que se aproveitam de debilidades no sistema imunológico e podem se converter em epidemias em razão de imprudência ou negligência humana. No último parágrafo de A Peste, obra-prima de Albert Camus, o personagem Bernard Rieux refletia: “O bacilo da peste não morre, nem desaparece, espera com paciência… e chega talvez o dia em que… a peste acorda os ratos e os manda morrer numa cidade feliz”.

Traçando um paralelo, perversidades sociais, a exemplo do crime organizado, corrupção e vícios de todos os gêneros, constituem uma ameaça permanente, sobretudo em países com fragilidades institucionais e déficit civilizatório, como o Brasil. Esse entendimento é abonado por fatos recentes.

A Constituição de 1988 admitiu que a proposta orçamentária pudesse ser objeto de emenda para proceder à “correção de erros ou omissões”. Tese, em princípio, razoável.

Essa brecha legal serviu, todavia, de pretexto para, artificialmente, elevar a receita e financiar “emendas parlamentares”. De início, elas constituíam valores modestos; hoje representam quase ¼ das despesas discricionárias da União, desdobrando-se em uma larga coleção de alternativas (emendas individuais, de bancada, impositivas, secretas e as teratológicas emendas Pix), que acentuam as distorções no já disfuncional federalismo fiscal e são fonte poderosa de corrupção. Reverter essa iniquidade requer uma desproporcional energia política.

Apostas esportivas tem sido feitas até com o dinheiro advindo do Bolsa Família
Apostas esportivas tem sido feitas até com o dinheiro advindo do Bolsa Família Foto: Felipe Rau / Estadão

A incapacidade de enfrentar os crônicos desequilíbrios fiscais por meio do gasto pretexta a elaboração de fantasias, como teto de gastos e arcabouço fiscal, e a busca alucinada por novas fontes de receita, não raro esdrúxulas, como a anistia parcial em decisões tomadas no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) pelo voto de qualidade, ou tóxicas, como a tributação de apostas esportivas (“bets”).

Até mesmo o Bolsa Família tem sido utilizado em apostas esportivas, em abusivo desvio de finalidade.

Não consigo entender a surpresa diante desse quadro, construído por uma combinação de maciça publicidade, amplo patrocínio dos clubes de futebol e legislação que ampara a atividade.

São pífias as medidas cogitadas para enfrentar a febre das “bets”, como o controle de licenças para exploração da atividade e a vedação do uso de recursos do Bolsa Família. Ingenuidade ou impotência? A febre não será debelada.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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