Meu adeus a Chico Bocão (*)

By | 07/09/2014 12:01 am

Conheci Francisco Antônio de Maria (Chico Bocão) na década de sessenta quando eu trabalhava no Armazém do Leão, cujo proprietário era seu primo. Ali trabalhava também Zé do Leão que era irmão de Chico. Três irmãos tinham vindo de Pocinhos e se radicaram em Patos, juntamente com os filhos que trouxeram. Os patriarcas eram Antônio Chico (que aqui chegou em 1946), pai de Chico Bocão, Zé do Leão e Nezinho; Zé Chico, pai de Inácio do Leão, Zé Silva e Manoel Silva; e Celestino Francisco, pai de Manoel Celestino e Inacinha. Só os dois últimos (Manoel e Inacinha) estão vivos. Apaixonado eleitor de Zé Cavalcanti, candidato naquele ano a prefeito de Patos, em 1963, Chico Bocão saiu candidato a vereador pela primeira vez e Inácio do Leão pediu aos empregados que votassem nele, o que todos fizeram espontaneamente por conhecerem a Chico e terem muita atenção a “seu” Inácio. Chico conseguiu se eleger, obtendo 366 votos, para o primeiro de dez mandatos e uma suplência, origem dos onze diplomas que ele ostentava com muito orgulho.

Residindo em um bairro de maioria carente, Chico virou a previdência dos seus eleitores, que o elegeram a primeira vez, justamente por que ele gostava de ajudar os vizinhos. Levava doentes para o hospital, dava toda assistência e no caso de óbito providenciava o funeral. Além das ajudas que dava para a compra de numa feira ou do leite de um filho doente, na compra de um remédio, numa passagem para visitar um parente. Graças a essa assistência que dava aos amigos, Chico se reelegia a cada ano. Quando outras fontes de assistência apareceram os votos começaram a minguar, mas mesmo assim, Chico conseguiu se reeleger dez vezes: 1968 (978 votos); 1972 (1002 votos); 1976 (1090 votos); 1982 (1035 votos); 1988 (868 votos); 1992 (o mais votado com 916 votos); 1996 (1066 votos); 2000 (1ª suplência com 721 votos, 29 a menos que Assis); 2004 (1346 votos); 2008 (2102 votos). Na antepenúltima disputa ficou na suplência por menos de trinta votos, mas conseguiu voltar à Câmara nas duas eleições posteriores.

Na Câmara, apesar das poucas letras, Chico teve uma atuação parlamentar muito melhor do que muitos doutores que passaram pela Casa de Juvenal Lúcio de Sousa, nos últimos cinquenta anos. Durante a discussão da Lei Orgânica do Município, em 1990, quando tive a honra de assessorar a Câmara na elaboração daquela lei, assisti a uma defesa que Chico fez de uma proposta apresentada pelo seu adversário Petrônio Lucena. Chico fez uma defesa tão bem articulada da matéria que convenceu a quantos o ouviram. Nem parecia um homem de tão poucas letras. Fiquei impressionado com a sua eloquência.

Toda a cidade conheceu a sua coerência ao longo de cinquenta anos de vida pública. Nasceu politicamente no PTB, partido pelo qual se elegeu a primeira vez, depois passou pela ARENA, pelo Partido Popular e, acompanhando Edvaldo Motta, migrou para o PMDB. Nunca pulou de “galho em galho” como muitos fazem hoje.

Na última eleição, já com problemas de saúde, desistiu de concorrer e lançou candidata uma das filhas, Fátima, que não obteve sucesso. Ficou na terceira suplência com 913 votos. Lutou nos últimos anos com vários problemas de saúde que terminaram vencendo aquele grande lutador, na última quarta-feira, 03 de setembro, aos oitenta e dois anos de idade. Durante o velório tivemos oportunidade de conversar com dona Cleonice, sua companheira de toda a vida, que me contou que até os últimos tempos, mesmo em meio aos males de que padecia, Chico continuava “ligado” nas coisas da política e ficava pesaroso quando sabia de um amigo que estava doente e a quem não podia visitar. E nunca deixou de ouvir a nossa Revista da Semana. Mesmo retido no leito, pedia que ligassem o “radinho” para ouvir o programa.

Nascido em Pocinhos, Chico se fez patoense e foi mais fiel à nossa cidade de que muitos que aqui nasceram, motivo pelo qual muitos choraram durante o seu velório e seu sepultamento. Nós mesmos nos emocionamos ao vê-lo pela última vez, lembrando meu pai, seu amigo de muitos anos.

Daqui o nosso abraço para dona Cleonice, para Nego que sempre me dava notícias de Chico e de sua luta contra a doença, para Fátima e Gloriete. Também para netos e bisnetos. Chico cumpriu a sua missão e cumpriu-a muito bem. Patos perdeu um grande filho seu, daqueles que estão ficando cada vez mais raros. O povo de Patos o homenageou em casa, na Câmara e na sua última caminhada até o cemitério de São Judas Tadeu, onde centenas de pessoas compareceram. (LGLM)

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Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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