Devagar, quase parando

By | 21/09/2014 7:48 am

(Editorial da Folha de São Paulo, neste domingo)

Desigualdade cai em ritmo mais lento desde 2011, e aumento de renda é menor; nesse ritmo, em breve poderá haver estagnação de fato

É vergonhoso que um órgão reputado como o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) precise vir a público para corrigir, um dia depois de sua divulgação, os resultados de levantamento tão importante quanto a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios.

Segundo se soube na sexta-feira (19), um erro de projeção populacional teria levado técnicos a superestimar o peso de regiões metropolitanas de alguns Estados, com prejuízos para o cômputo nacional.

As emendas, de todo modo, não chegam a provocar revisões nas tendências apontadas na véspera –seu maior impacto é sobre a credibilidade do próprio instituto.

Refeitos os cálculos, nota-se que a desigualdade não ficou inalterada, embora o progresso seja agora mais lento do que o de anos anteriores, e que o aumento da renda foi menor do que o apontado nas tabelas equivocadas.

Num país que está entre os 20 mais iníquos do mundo e que tem uma renda média baixa, melhorias modestas já causam preocupação. Ainda pior, tal estagnação se deve em parte a erros básicos de política econômica e à incapacidade de promover mudanças institucionais, evidentes no governo da presidente Dilma Rousseff (PT).

A combinação de desigualdade e baixa renda resulta em dureza inaceitável de condições de vida para quase metade da população. A renda média domiciliar per capita dos 40% mais pobres não passava de R$ 332 por mês no ano passado. O rendimento médio do 1% mais rico equivalia a 40 vezes o dos 40% mais pobres.

Embora convenha ter em mente esse quadro geral, observe-se que houve progressos, mesmo depois de 2011, para todas as faixas da população. Além disso, mais trabalhadores passaram a ter vínculos formais de trabalho e a contribuir para a Previdência. A qualidade do emprego melhorou.

De 2004 a 2013, o rendimento médio nacional aumentou 35%. O dos 10% mais pobres, cresceu quase 73%; entre a metade mais pobre, mais de 63%. Houve, portanto, elevação do bem-estar social.

Tais avanços se refletiram no consumo de bens. Cerca de 59% das residências tinham telefone em 2001; em 2013, eram 93%. A posse de computadores passou de 13% para 49% nesse período.

A presença de eletrodomésticos se universalizou, mas a ampliação do acesso a serviços públicos é lenta. A proporção de casas ligadas à rede de esgotos, por exemplo, passou de 55% para 64%.

Quanto à renda, progressos relativamente rápidos são possíveis, em especial quando se combinam políticas sociais com mudanças que promovem a produtividade e a estabilidade econômica.

Ao menos desde 2011, todavia, vê-se uma economia de regras e ritmos instáveis. Investimento e produção declinantes afetaram o aumento do salário mínimo e de recursos públicos para programas sociais e ampliação da infraestrutura. Não houve, ademais, reformas que tornassem a tributação racional e socialmente mais justa.

Caso o país prossiga nessa toada, poderá em breve lidar com as tensões políticas derivadas de uma estagnação socioeconômica de fato.

Comentário

Comentário

Category: Blog

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *