Ataques do presidente ao sistema eleitoral transformaram cerimônia numa resposta ao próprio chefe do Executivo
Não fosse a presidência de Jair Bolsonaro, a posse de Alexandre de Moraes seria apenas uma posse. As trocas de comando do Tribunal Superior Eleitoral costumam reunir algumas autoridades e uma fração do mundo jurídico em um evento rápido, protocolar, com pouco ou nenhum destaque na imprensa e na sociedade. Os ataques de Bolsonaro às eleições, no entanto, fizeram com que a cerimônia virasse uma resposta ao próprio presidente – que a tudo assistiu, de testa franzida e paralisado, em lugar de honra no plenário do tribunal.
A posse de Alexandre de Moraes é a segunda vigília cívica em defesa das eleições e do trabalho da Corte eleitoral em cinco dias. Mas, se na semana passada Bolsonaro pôde evitar a presença em São Paulo, onde era celebrada a “cartinha” pela democracia, desta vez assistiu a tudo em silêncio.
As cenas do plenário lotado de figurões da política nacional foram transmitidas ao em tempo real nos principais canais de notícia. Quatro ex-presidentes, dos seis que estão vivos, e 22 governadores de diferentes posicionamentos políticos viajaram a Brasília para demonstrar o respeito ao processo eleitoral, o mesmo que Bolsonaro questiona. Candidatos ao Planalto pararam suas campanhas para prestigiar a posse que se tornou uma ode às urnas eletrônicas. Sem a confiança da população no processo e nos árbitros do processo – leia-se, em Moraes – os candidatos sabem que de nada adianta buscar votos na rua.
Moraes foi longamente aplaudido (e deixou tempo para que fossem ouvidos os aplausos). É como se cada minuto a mais de palmas desse legitimidade ao seu trabalho. A plateia levantou quando, de cara, o ministro disse que o sistema eleitoral é um orgulho nacional. Bolsonaro olhava para o horizonte enquanto aquele que já chamou de “canalha” era ovacionado.
É raro imaginar uma cena em que Dilma Rousseff e Michel Temer dividem a mesma sala. Que Luiz Inácio Lula da Silva fala ao pé do ouvido do ex-presidente emedebista mesmo sob espiadelas do primeiro escalão do governo Bolsonaro, seu principal adversário na disputa eleitoral deste ano. Que José Sarney se junte a Dilma para evitar a saia justa de fazê-la sentar ao lado de Temer. Ou que uma posse de presidente do TSE faça a esvaziada Brasília pré-eleição reunir políticos de todos os espectros partidários e atraia as atenções da imprensa nacional.
Ao protagonizar ataques inéditos no período democrático, Bolsonaro tem sido o maior cabo eleitoral para uma reação também inédita.