O que é a autonomia do Banco Central, criticada por Lula (seguido de comentário nosso)

By | 15/02/2023 10:23 am

Presidente da República chegou a classificar a autonomia do BC formalizada em lei como ‘bobagem’; um dos principais objetivos da autonomia é blindar a autarquia contra interferências políticas

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem feito críticas nas últimas semanas à autonomia do Banco Central (BC) e à condução da política monetária pelo órgão. Aliados do petista, como o ministro da FazendaFernando Haddad, endossaram as críticas, e o partido quer convocar o presidente do BC, Roberto Campos Neto, para explicar a política de juros.

Lula chegou a classificar a autonomia da autarquia federal como uma “bobagem”. Para o presidente, a autonomia formalizada em lei não traria benefícios pois ele afirma que já promovia a independência do BC durante seus dois primeiros mandatos, mesmo sem uma obrigação legal. Mas, afinal, o que é a autonomia do BC?

De modo geral, a autonomia do BC significa liberdade para tomar decisões acerca da política monetária sem pressões ou interferências do governo, o que contribui para uma maior transparência e mais credibilidade para o órgão, diz Ricardo Jorge, especialista em renda fixa e sócio da Quantzed, casa de análise e empresa de tecnologia e educação para investidores.

“A autonomia do Banco Central foi uma conquista muito grande para o País, porque assim o órgão tem a independência de tomar as decisões que forem necessárias para cumprir as suas metas. E sem que os governos tentem interferir para tentar se beneficiar em termos de popularidade, pressionando por decisões que trazem efeitos nocivos para a economia”, explica.

A autonomia do Banco Central foi estabelecida por lei apenas em 2021, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Entre outros pontos, ela estabeleceu mandatos fixos para o presidente e para os diretores da autarquia federal, além de regras mais rígidas para a admissão e demissão desses dirigentes. Os nomes são indicados pelo presidente da República e devem ter aprovação do Senado.

A lei determinou ainda que o presidente do BC deverá apresentar ao Senado, com arguição pública, relatório de inflação e relatório de estabilidade financeira a cada semestre, explicando as decisões tomadas no período anterior. O BC também passou a ser classificado como uma autarquia de natureza especial caracterizada pela “ausência de vinculação a Ministério, de tutela ou de subordinação hierárquica” – até então, o BC era vinculado ao antigo Ministério da Economia.

Os mandatos fixos de diretores devem ocorrer em ciclos não coincidentes com a gestão do presidente da República – ou seja, um presidente da República pode ter de conviver com dirigentes indicados pelo presidente anterior, o que é o caso de Roberto Campos Neto, atual presidente da autarquia, indicado por Bolsonaro. Com isso, os dirigentes, que determinam o patamar da taxa básica de juros (Selic), atualmente em 13,75% ao ano, teriam mais condições de manter a continuidade da política monetária, independentemente do presidente da República eleito.

Segundo o próprio Banco Central, a autonomia tem como uma das principais funções separar o ciclo político do ciclo de política monetária. “Por sua própria natureza, a política monetária requer um horizonte de longo prazo, por conta da defasagem entre as decisões de política e seu impacto sobre a atividade econômica e a inflação. Em contraste, o ciclo político possui um horizonte de prazo mais curto”, afirmou o BC, em nota publicada em 2021, em meio à aprovação da lei da autonomia do órgão no Congresso.

Ainda de acordo com o BC, um maior grau de autonomia está associado a níveis mais baixos e menor volatilidade da inflação, contribuindo para a estabilidade do sistema financeiro, promovendo maior credibilidade ao BC e permitindo à instituição “buscar seus objetivos, estabelecidos em lei e pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), de maneira técnica, objetiva e imparcial”. A autarquia aponta ainda que a autonomia reduz a instabilidade econômica em períodos de transição de governo e alinha o BC às melhores práticas internacionais.

De modo geral, a autonomia do BC significa liberdade para tomar decisões acerca da política monetária sem interferências do governo.
De modo geral, a autonomia do BC significa liberdade para tomar decisões acerca da política monetária sem interferências do governo.  Foto: Dida Sampaio/Estadão

Ao responder as críticas de Lula, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, afirmou que a autonomia formalizada em lei ajuda a diminuir a volatilidade do mercado. “Olhando para o Brasil, vemos que o mercado seria muito mais volátil se não houvesse a independência em lei. Seria uma questão que adicionaria mais volatilidade na curva longa de juros”, disse, em palestra realizada em janeiro na UCLA Anderson School of Management.

A avaliação, portanto, é de que a autonomia traz uma maior credibilidade frente ao mercado financeiro. “Além de blindar o Banco Central dessas pressões políticas, que podem existir em qualquer país do mundo, a autonomia resulta também em outros benefícios, como ancoragem das expectativas e redução da volatilidade, por sabermos que é um agente econômico independente, que vai fazer o que é necessário para trazer a economia para o eixo”, conclui Ricardo Jorge, da Quantzed.

Comentário nosso

O simples fato de incomodarem aos políticos, justifiva a automonia de determinados órgãos governamentais. É o caso do Banco Central e das agências reguladoras. “Agência reguladora é uma pessoa jurídica de direito público interno, geralmente constituída sob a forma de autarquia especial ou outro ente da administração indireta, cuja finalidade é regular e/ou fiscalizar a atividade de determinado setor da economia de um país, a exemplo dos setores de energia elétricatelecomunicaçõesprodução e comercialização de petróleorecursos hídricos, mercado audiovisualplanos e seguros de saúde suplementar, mercado de fármacos e vigilância sanitáriaaviação civiltransportes terrestres ou aquaviários etc.”  Entre outras menos conhecidas temos as seguintes agências reguladoras: ANEEL, ANATEL, ANVISA, ANA E PETROBRÁS. Em comum com o Banco Central elas têm o fato de terem uma natureza especial. Segundo a lei LEI Nº 13.848, DE 25 DE JUNHO DE 2019, em seu artigo 3º, “A natureza especial conferida à agência reguladora é caracterizada pela ausência de tutela ou de subordinação hierárquica, pela autonomia funcional, decisória, administrativa e financeira e pela investidura a termo de seus dirigentes e estabilidade durante os mandatos, bem como pelas demais disposições constantes desta Lei ou de leis específicas voltadas à sua implementação.” Ou seja, os seus dirigentes não podem ser exonerados pelo Presidente da República, tendo que cumprir o seu mandato até o fim, o que os torna imunes a pressão para modificarem as suas decisões, o que está acontecendo agora com o Banco Central, a quem Lula tentou forçar a modificar a taxa de juros que é determinada pelo COPOM (Conselho de Política Monetária), órgão vinculado ao Banco Central. Um caso exemplar é o que aconteceu com a ANVISA, durante a PANDEMIA. A ANVISA divergia das tentativas de Bolsonaro de impor as suas barbaridades com relação à condução do combate à pandemia, mas a ANVISA sustentou as suas posições baseadas na orientações científicas, justamente por que Bolsonaro não poderia demitir os seus dirigentes. (LGLM)

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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