Cabe ao STF rejeitar a judicialização da política (seguido de comentário nosso)

By | 20/02/2023 8:18 am

A defesa da Constituição inclui defender as competências do Congresso. STF precisa rejeitar liminarmente as ações ineptas. Tramitação de ação do PCdoB contra Lei das Estatais é absurda

 

(OPINIÃO DO ESTADÃO, 20/02/2023)

 

Imagem ex-libris

Tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) 7331, contra a Lei das Estatais (Lei 13.303/2016). O PCdoB, autor da ação, questiona os dispositivos que restringem as indicações, para empresas estatais, de conselheiros e diretores titulares de alguns cargos públicos ou que tenham atuado, nos três anos anteriores, na estrutura de partido político ou em campanha eleitoral.

A Adin 7331 constitui evidente judicialização da política. Tendo perdido no Congresso, o PCdoB tenta agora no Judiciário reverter a derrota. O caso encaixa-se perfeitamente na situação retratada pelo presidente Lula da Silva em encontro com lideranças partidárias no mês passado: “Nós temos culpa de tanta judicialização. A gente perde uma coisa no Congresso Nacional e, ao invés de a gente aceitar a regra do jogo democrático de que a maioria vence e a minoria cumpre aquilo que foi aprovado, a gente recorre a uma outra instância para ver se a gente consegue ganhar”.

No entanto, a explicitar que uma coisa é o discurso do presidente da República e outra, muito diferente, é a ação prática do seu governo, a União, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), manifestou-se na Adin 7331 favoravelmente ao pedido do PCdoB, dizendo que os dispositivos contestados da Lei das Estatais são inconstitucionais. Segundo a AGU, as restrições fixadas pelo Congresso violariam “a proporcionalidade e a razoabilidade na medida em que presumem a má-fé dos indivíduos a que se refere”.

Ora, é evidente que o Congresso tem competência para definir critérios e restrições para os cargos nas estatais e empresas de economia mista. É matéria que cabe ao Legislativo decidir. No caso da Lei 13.303/2016, foi a própria política quem definiu os limites para a política. Mais legítimo e constitucional, impossível.

No entanto, mesmo numa situação com esse grau de evidência, um partido político ajuíza uma Adin no STF e consegue, com a tática judicial, criar um fato político. Mesmo que seu pedido não seja acolhido no final da ação, a legenda consegue, ao menos por um tempo, pôr sob suspeição a vontade cristalina do Congresso e atribuir ao Judiciário um poder político que não lhe cabe. Trata-se de sistema disfuncional, que ainda sobrecarrega o STF com temas estranhos à sua alçada. Nem se diga quando a Corte, por algum motivo inusitado, decide interferir na legislação aprovada no Congresso, vendo inconstitucionalidade onde não existe. Nesse caso, o estrago é ainda maior.

É urgente pôr freios à prática da judicialização da política, que enfraquece o princípio democrático e dificulta a responsabilização política do Congresso pelo eleitor. Para tanto, uma medida simples e acessível é o Supremo, de forma constante, rejeitar liminarmente as Adins manifestamente improcedentes. Trata-se do necessário respeito ao princípio da separação dos Poderes. Defender a vontade da população, manifestada por meio de seus representantes eleitos, é uma forma muito concreta de o STF defender a Constituição.

A Lei 9.868/1999, que disciplina o processamento das Adins e da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC), é taxativa. “A petição inicial inepta, não fundamentada, e a manifestamente improcedente serão liminarmente indeferidas pelo relator”, diz seu art. 4.º. Ou seja, o indeferimento das Adins ineptas não significa inventar nada, mas apenas cumprir a lei. A aplicação desse dispositivo legal preserva não apenas as competências do Legislativo e a capacidade de trabalho do Judiciário, que ficará poupado de perder tempo com casos explicitamente improcedentes. Ela contribui para um aspecto decisivo da República, cuja ausência é frequentemente criticada no País: o fortalecimento da autoridade e da estabilidade da lei vigente.

Na missão de defesa da Constituição, tão importante quanto não deixar que leis inconstitucionais continuem vigentes é assegurar que as leis constitucionais produzam, sem obstáculos e entraves, todos os efeitos que o Congresso estabeleceu. Esse é o dever do STF.

Comentário nosso

Concordo em gênero, número e grau com a opinião do Estadão. Mesmo sendo o Congresso corrupto que temos, foi o Congresso que o povo elegeu e como tal deve ser respeitado, até porque este Congresso pode alterar a Constitução naquilo que não sejam “cláusulas pétreas” ou que não as afronte.  (LGLM)

 

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Category: Nacionais

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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