O Congresso cumpre seu papel

By | 12/05/2023 6:50 am

Parlamentares têm mostrado disposição para corrigir deficiências do projeto de arcabouço fiscal. Como apresentado, o texto é um simulacro de controle das contas públicas

 

(Editorial do Estadão, em 12/05/2023)

 

Imagem ex-libris

O relator do PLC 93/2023 na Câmara, o deputado Cláudio Cajado (PP-BA), se reuniu há poucos dias com os representantes de nove bancadas partidárias. Juntas, elas correspondem a quase 80% do plenário da Casa. Esse grupo, segundo consta, pediu que o relatório final incorpore as sanções e gatilhos mais arrojados para o corte de despesas em caso de descumprimento das regras fiscais que foram ignorados de propósito pelo governo.

Note-se que os parlamentares não estão pedindo nada além do minimamente razoável em se tratando de um marco legal que se presta a equilibrar as contas públicas. Eles pedem, por exemplo, que o texto impeça o governo de conceder aumento salarial a servidores acima da inflação em caso de estouro das despesas. Pedem que não se realizem concursos públicos ou que se concedam benefícios fiscais a empresas quando as contas estiverem no vermelho. Outra demanda sensata é a de que o governo se comprometa com o cumprimento do objetivo fiscal por meio do bloqueio de despesas. No texto original, o chamado contingenciamento não é obrigatório.

Como se vê, não são pedidos extravagantes; são a essência de um arcabouço fiscal digno do nome.

Além do problema estrutural do PLC 93/2023, qual seja, a dependência excessiva do aumento das receitas para o equilíbrio fiscal, deixando o controle das despesas praticamente intocado, o projeto, caso seja aprovado como foi elaborado pelos Ministérios da Fazenda e do Planejamento, ainda ferirá de morte a Lei Complementar 101/2000, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O texto exime o presidente da República, entre outros agentes públicos, de quaisquer sanções jurídicas e políticas em caso de descumprimento das regras definidas pelo próprio projeto, o que é um despautério (ver editorial A LRF não é optativa, 22/4/2023).

Talvez, vá saber, essa conveniente imprevisão de sanções decorra do trauma dos petistas com a justa cassação de Dilma Rousseff por suas notórias pedaladas fiscais. Mas, no Congresso, essa frouxidão não pode prosperar. Definir metas sem prever mecanismos de engajamento ao seu cumprimento significa, na prática, não ter meta alguma.

O governo, evidentemente, fará de tudo para manter o projeto tal como está. O líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PR), disse ao Estadão que vem “pedindo diariamente” ao relator do PLC 93/2023 que “não torne o texto mais rígido do que ele já é”. Cajado, contudo, “evita responder”, segundo o petista. Chega a soar como pilhéria classificar como “rígido” um marco legal que não prevê sanção alguma aos que, eventualmente, vierem a descumpri-lo.

O Congresso tem muito trabalho a fazer para dotar o País de um arcabouço fiscal crível e, principalmente, coadunado com desafios nacionais que só haverão de ser superados a partir de um Orçamento público equilibrado, entre outros fatores. O texto do arcabouço fiscal encaminhado pelos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet, em que pesem as suas deficiências, não é para ser jogado fora de todo. Os parlamentares decerto não precisam reescrevê-lo; precisam aprimorá-lo.

Dada a disposição do Congresso e, é importante ressaltar, dos próprios ministros Haddad e Tebet para construir a várias mãos o novo arcabouço fiscal, inclusive tocando em questões sensíveis como os gastos tributários, há uma avenida de melhorias a ser trilhada. Quanto mais firme for o engajamento do Executivo e do Legislativo nesse esforço concentrado, em especial para eliminar as exceções que só enfraquecem o espírito do PLC 93/2023, tanto melhor será para o Brasil.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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