Pelo fim do prêmio aos juízes delinquentes (com comentário nosso)

By | 26/02/2024 7:13 am
Imagem ex-librisA igualdade de todos perante a lei é o pilar fundamental que sustenta todas as instituições do Estado de Direito. Paradoxalmente, a corporação incumbida de aplicar a lei igualmente a todos e punir todos os seus infratores é justamente aquela que mais distorce, desfigura e burla a lei a seu favor para concentrar renda, acumular privilégios e blindar-se de punições. Este é um dos maiores sintomas da corrupção institucional do Estado brasileiro. Nenhum Poder evidencia mais a subversão do Direito para consolidar a injustiça do que a própria Justiça.

No Brasil, um dos países mais desiguais do mundo, o teto salarial da magistratura é 15 vezes maior que o rendimento médio dos brasileiros. Na Europa é só 4 vezes maior. Mas, peritos em violar o teto constitucional, juízes (e, na esteira, promotores) engordam seus contracheques se autoconcedendo todo tipo possível e imaginável de auxílios, gratificações e indenizações que se somam a 60 dias de férias e aposentadoria integral. Não surpreende que os juízes ocupem o 0,1% que se encontra no topo da pirâmide social nem que o Judiciário brasileiro seja um dos mais caros do mundo.

Mas o caso mais venal dessa perversão institucionalizada da moralidade pública – por conjugar, a um tempo, desigualdade de renda, privilégio legal e impunidade – talvez seja a “pena disciplinar” máxima prevista na Lei Orgânica da Magistratura por infração ou delito grave: aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço. No âmbito administrativo, é esse o castigo mais duro a juízes que, por exemplo, descumpriram seus deveres, praticaram tráfico de influências, venderam sentenças ou participaram ativamente de organização criminosa.

Segundo levantamento da revista piauí, entre 2005 e 2019 o Conselho Nacional de Justiça “puniu” com aposentadoria 35 juízes de primeira instância, 22 desembargadores e 1 ministro do Superior Tribunal de Justiça por delitos como venda de liminares e sentenças a bicheiros e narcotraficantes, estelionato e desvio de recursos públicos. Nesse período, os 58 magistrados receberam, sem trabalhar, vencimentos totais de R$ 137,4 milhões, o suficiente para pagar 1.562 aposentados pelo INSS.

Recentemente, um juiz do TRT da 2.ª Região foi aposentado aos 41 anos por assédio sexual a quase 30 mulheres. Em casos como esse, que envolvem crime, o juiz ainda poderá num futuro remoto ser expulso e perder os proventos após sentença judicial transitada em julgado. Até lá, seguirá gozando do dolce far niente à custa do contribuinte e, se e quando for expulso, nada será ressarcido. Nos outros casos, de juízes punidos por infrações administrativas, eles receberão religiosamente uma renda vitalícia de R$ 32 mil, podendo ganhar mais com outras atividades. Enquanto para o trabalhador comum uma aposentadoria média do INSS de R$ 1,7 mil (na melhor das hipóteses, de R$ 7,5 mil) será uma conquista de 40 anos de trabalho e contribuição, para os juízes delinquentes essa quantia será só uma fração irrisória do “castigo” dado por seus colegas de toga.

Nos últimos dias de seu mandato no Senado, o agora ministro do Supremo Tribunal Federal Flávio Dino protocolou uma proposta de emenda à Constituição que elimina a pena de aposentadoria e prevê a expulsão de juízes que cometeram delitos graves. O estatuto valerá também para outros servidores que ocupam cargos vitalícios, como promotores e militares. “Se um servidor público civil pratica um ato de corrupção, ele é processado administrativamente e é demitido, perde o cargo. Praticamente 99% dos servidores públicos se submetem a essa lógica”, disse Dino. “Não há vitaliciedade que se sobreponha à moralidade administrativa.”

Esse não é o primeiro projeto do gênero, e os outros sepultados nos escaninhos do Congresso despertam o temor de que não será o último. Se desta vez vier a ser aprovado, eliminará o mais ultrajante dos privilégios da magistratura. Mas ele é só um, só uma fração irrisória do todo. Mesmo eliminado, a sociedade precisará pressionar seus representantes eleitos para erradicar os outros 99%.

Comentário nosso

Qualquer funcionário que cumpra mal o seu papel pode perder o emprego se for condenado por isto. É o certo, ninguém discute isso. Mas um juiz, “pode pintar e bordar”, cometendo delitos como venda de liminares e sentenças a bicheiros e narcotraficantes, estelionato e desvio de recursos públicos. A pena que sofre num caso destes é a aposentadoria compulsória, mas com direito a continuar recebendo os rendimentos que recebia. Isto é um verdadeiro absurdo. É isto que o agora Ministro do STF, Flávio Dino, quando ainda senador, está tentando acabar com o seu projeto. Esperamos que o Congresso Nacional crie vergonha e acabe com este absurdo. (LGLM)

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Category: Nacionais

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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