Mudança no foro enfraquece tese de que STF não pode julgar Bolsonaro por joias e cartão de vacina

By | 30/03/2024 6:32 am

Supremo discute alcance do foro e mudança pode impactar ações sobre Jair Bolsonaro; Luís Roberto Barroso suspendeu julgamento após cinco votos pela manutenção da prerrogativa mesmo após a saída do político do cargo

(Karina Ferreira, no Estadão, em 29/03/2024)

Após perder a reeleição em 2022 e deixar a Presidência, Jair Bolsonaro (PL) perdeu automaticamente o foro privilegiado, que garante que possíveis crimes cometidos por ele, enquanto possuía mandato e no exercício da função, sejam julgados no Supremo Tribunal Federal (STF). A possível manutenção da prerrogativa mesmo após a saída do político do cargo, em análise na Corte, pode fazer com que processos contra o ex-presidente que tramitam em instâncias inferiores sejam julgados no STF e também derrubar a argumentação da defesa dele em casos que já tramitam no Tribunal.

O julgamento sobre o alcance do foro privilegiado teve início nesta sexta-feira, 29. Os ministros Cristiano ZaninDias Toffoli e Flávio Dino acompanharam o relator do caso, ministro Gilmar Mendes, e defenderam que a regra deve valer para crimes funcionais, mesmo após a saída da função. O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, suspendeu o julgamento ao pedir vista (mais tempo para análise). Mesmo com a suspensão, o ministro Alexandre de Moraes decidiu antecipar o voto e também seguir o entendimento do decano da Corte.

Ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pode passar a ter processos julgados no STF caso foro privilegiado for estendido pelos ministros.
Ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pode passar a ter processos julgados no STF caso foro privilegiado for estendido pelos ministros. Foto: Dida Sampaio/Estadão

Na Suprema Corte, Bolsonaro é alvo de cinco inquéritos. No caso sobre a suposta fraude nos cartões de vacina da covid-19, a defesa de Bolsonaro argumenta que o tema não está relacionado ao exercício do mandato dele, em uma tentativa de encaminhar o processo para primeira instância. Ao indiciar o ex-presidente por associação criminosa e inserção de dados falsos em sistema de informação, a Polícia Federal (PF) correlacionou a fraude na carteira de vacinação do ex-chefe do Executivo à apuração que o colocou no centro de uma suposta tentativa de golpe de Estado.

Na apuração sobre as joias sauditas, esquema revelado pelo Estadão, a defesa também questiona a competência do STF para julgar o caso, por Bolsonaro ter perdido o foro privilegiado ao deixar a Presidência. Moraes, o relator do inquérito, argumenta que há conexão com outras investigações e, portanto, o caso deve ser mantido no Supremo. Se o novo entendimento entrar em vigor por decisão da Corte, não haverá mais discussão sobre a competência do julgamento, que permanecerá no Tribunal.

Já outro inquérito, envolvendo os ataques de 8 de Janeiro, tramita no Supremo não pelo foro de prerrogativa, mas sim porque tem o próprio Tribunal como alvo. Os outros inquéritos seguem na Corte porque utilizam um princípio presente nas diretrizes do mecanismo, que faz com que o processo seja mantido na instância máxima caso pelo menos um dos envolvidos tenha a prerrogativa.

Se o entendimento defendido pelo relator passar a valer, casos de Jair Bolsonaro que envolvam o exercício da função também voltam para o STF, mesmo ele não sendo mais presidente da República. Segundo o site JusBrasil, o nome do ex-presidente aparece em 168 peças processuais.

Um exemplo é uma ação civil pública contra Bolsonaro envolvendo a violação do direito de imagens de crianças e adolescentes, protocolada em 15 de fevereiro de 2023. Nela, o ex-chefe do Executivo é acusado de usar as imagens sem autorização dos pais durante a campanha eleitoral para se reeleger, em 2022. A defesa dele não comentou o tema.

Outros dez casos foram enviados do STF para instâncias inferiores assim que o mandato do ex-presidente terminou. Cinco ações são sobre a suposta ameaça ao livre funcionamento do Judiciário e a suspeita de uso de recursos públicos nos atos do 7 de Setembro de 2021, remetidos ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). As alegações incluem crimes contra a ordem constitucional e delitos tipificados na antiga Lei de Segurança Nacional e no Código Penal.

Além deles, outros casos foram remetidos para instâncias inferiores, como uma queixa-crime por difamação e outra por injúria. No primeiro, Bolsonaro é acusado de difamação pelo senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP) devido a uma publicação em redes sociais sobre a negociação de vacinas Covaxin. No segundo, a ex-presidente Dilma Rousseff alega que foi insultada por Bolsonaro no X (antigo Twitter), em um post em que o ex-presidente teria depreciado os trabalhos da Comissão da Verdade, configurando possível crime de injúria.

Comentário nosso

O entendimento anterior do STF permitia que o criminoso que tinha direito ao foro privilegiado escapasse de julgamento pelo STF se após cometer o crime no exercício do mandato, perdesse o mandato ou renunciasse a ele. Neste caso, o processo voltaria para a primeira instância, onde um juiz qualquer poderia absolvê-lo ou, no mínimo, retardasse a chegada do processo a instâncias superiores.  Como a votação do STF no sentido de mudar esta interpretação já está em cinco a zero, é provável que seja confirmada, com apenas um voto dos seis ministros que faltam votar. (LGLM)

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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