Presidente mostrou mão pesada na gestão de Vale e Petrobras e fez as companhias perderam bilhões em valor de mercado; postura reacendeu medo de um governo mais intervencionista
Nas últimas semanas, a mão pesada do governo na economia ficou evidente com a postura do presidente Lula de intervir no comando de Vale e Petrobras, duas gigantes nacionais. O movimento não foi bem recebido pelos investidores, e as duas companhias perderam bilhões em valor de mercado.
As investidas de Lula ampliaram uma dúvida que sempre existiu desde o início deste governo, se o presidente iria por um caminho mais parecido com o do seu primeiro mandato, quando seguiu as regras de mercado, ou se adotaria uma rota mais parecida com a do seu segundo mandato e do governo Dilma Rousseff, marcados por um aumento de gastos e que levaram o País para a recessão de 2014 a 2016.
Nos momentos de grande incerteza com o rumo do governo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, aparece para colocar panos quentes no debate. Na atual gestão, ele tem sido o fiador de uma política econômica mais responsável. No ano passado, Haddad conseguiu vencer boa parte das disputas com a ala política.
Com a preocupação realçada sobre qual será a versão do presidente Lula até 2026, a incerteza que se cria tem potencial para prejudicar os investimentos e, consequentemente, o crescimento do País.
As interferências
● O presidente Lula atuou para que a Petrobras não distribuísse os dividendos extraordinários, o que frustrou os investidores. Lula disse que a empresa não tem de pensar apenas em acionistas, mas em investimentos. A companhia perdeu R$ 25 bilhões em valor de mercado em 2024, de acordo com cálculos de Einar Rivero, sócio-fundador da Elos Ayta Consultoria.
● Privatizada na administração Fernando Henrique Cardoso, o governo tentou emplacar o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega e outros nomes ligados ao governo no comando da empresa. A mineradora perdeu R$ 75,2 bilhões em valor de mercado desde o início do ano.
● Lula voltou a criticar o presidente do BC e afirmou que os bancos públicos podem baixar as taxas de juros de seus financiamentos para forçar outras instituições financeiras a também reduzirem os juros.
“Isso vai minando a confiança do investidor, pela ideia de uso político-ideológico das grandes empresas brasileiras.”
ANÁLISES
Presidente Lula é viciado em intervenções desastrosas nas estatais
Celso Ming, Jornalista e comentarista de economia
Independentemente da motivação ideológica, é complicada a administração de uma empresa de economia mista quando o chefe do Tesouro, acionista majoritário das ações com direito a voto, muda a cada quatro anos.
Ainda mais complicada e mais sujeita a contradições é a administração desta mesma empresa de economia mista quando tem de tomar decisões estratégicas levando em conta prazos longos, quase sempre superiores a dez anos, como é o caso da Petrobras – quando o horizonte de qualquer governo é de apenas um mandato, todos querendo repetir JK: fazer 50 anos em 5 (no caso, em 4). A governança vai pro brejo.
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Lula é mais mandão que governante e ainda sacode bandeiras dos tempos da Vila Euclides
Rolf Kuntz, Jornalista e comentarista de economia
Lula é mandão. Também é intervencionista, como dizem alguns, e isso reflete sua formação ideológica. Sua fala desastrada sobre a Petrobras, manchete dos grandes jornais, expressou essa formação. Em seu terceiro mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda sacode, e com maior vigor que nos governos anteriores, bandeiras dos tempos de Vila Euclides. Essas bandeiras foram carregadas mais discretamente no primeiro mandato, quando ele ouvia companheiros prudentes e mais familiarizados com administração.
O Lula de hoje é mais parecido com a ex-presidente Dilma Rousseff, resgatada politicamente e convertida em dirigente do Novo Banco de Desenvolvimento, conhecido também como Banco do Brics.
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Interferência política: quem é o verdadeiro dinossauro voraz?
Sérgio Lazzarini, Professor da Western University
Rebatendo críticas às suas recentes tentativas de interferir em empresas, Lula disse que “o mercado é um dinossauro voraz, quer tudo para ele e nada para o povo”.
A frase não deveria surpreender. Lula sempre deixou claro seu desconforto com o que dizia ser uma perda de ativismo estatal na economia. E, para ser justo, não é algo exclusivo desse governo. Bolsonaro havia reclamado que não queria ser rainha da Inglaterra e inventou de privatizar a Petrobras depois de não conseguir mandar na sua gestão.
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Governo Lula 3 é como o de Dilma: quanto mais intervenção, melhor
Vera Rosa, Repórter especial do ‘Estadão’
Acrise provocada pela divergência em torno da distribuição de dividendos extraordinários da Petrobras vai além das aparências e reflete a divisão no governo e no PT pelos rumos do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. Em conversas reservadas, até aliados do Palácio do Planalto mostram preocupação e há quem compare o governo Lula 3 ao da ex-presidente Dilma Rousseff por causa do intervencionismo na economia.
Em mais um capítulo do “estica e puxa” no Planalto, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se posicionou ao lado do presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, em defesa do pagamento de remuneração extra aos acionistas da Petrobras. Mas quem ganhou a guerra, ao menos até agora, foram os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Silveira (Minas e Energia).
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Intervenção em estatais e empresas privatizadas demonstra parque jurássico de ideias no governo Lula
Willian Waack, Jornalista e apresentador do programa WW, da CNN
OPalácio do Planalto virou hoje o principal pavilhão de exposições do parque jurássico de ideias. São aquelas que foram testadas e derrotadas pelos fatos, e nas quais se insiste, acreditando que o problema com as ideias (estatismo, por exemplo) não era de mérito, mas de dose (pouca).
Por esse motivo tem sido tão frequentemente aplicada aos inquilinos do Planalto a frase “nada aprenderam e nada esqueceram”. Ela capta o fato de que mesmo diante de grandes acontecimentos de resultados evidentes (como o desastre econômico ao final da era petista), alguns indivíduos e regimes não conseguem aprender com erros passados.
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ENTREVISTA
Samuel Pessôa, Pesquisador do Ibre/FGV
‘Lula é intervencionista na economia, é meio getulista’
Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, Samuel Pessôa avalia que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vive uma situação de autoengano, o que o leva a repetir políticas equivocadas, de maior intervenção do Estado na economia.
Em 2024, esse caminho tem ficado claro. O governo tentou emplacar o ex-ministro Guido Mantega no comando da Vale e abriu uma crise com o não pagamento de dividendos extraordinários na Petrobras. Em entrevista ao SBT, Lula ainda defendeu que os bancos públicos reduzam os juros para forçar uma redução por parte de outros participantes do mercado e voltou a criticar o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
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REPORTAGEM: LUIZ GUILHERME GERBELLI; EDITORA DE INFOGRAFIA: REGINA ELISABETH; EDITORES-ASSISTENTES DE INFOGRAFIA: ADRIANO ARAUJO E WILLIAM MARIOTTO; DESIGNER MULTIMÍDIA: LUCAS ALMEIDA; INFOGRAFISTA MULTIMÍDIA: ANA CÉLIA MOTA.