A desastrada revisão da PNAD 2013

By | 21/09/2014 8:23 am

O IBGE é inatacável, mas como a reputação do governo Dilma no manejo de estatísticas oficiais deixa a desejar, o tema deve entrar na agenda da campanha eleitoral

(Editorial do Jornal O Globo)

Em ano eleitoral, os resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), um precioso retrato anual do Brasil que o IBGE elabora, tendem a ter diferentes leituras e interpretações, conforme a visão de cada candidato .

Foi o que aconteceu na quinta-feira, tão logo o IBGE divulgou a Pnad referente a 2013 com informações que soaram como música aos ouvidos dos candidatos de oposição: após 20 anos de queda ininterrupta, a concentração de renda voltou a aumentar, e, no ano passado, surgiu o primeiro sinal de que o mercado de trabalho, pujante desde 2009, fraquejava.

Mas ontem, uma entrevista coletiva foi convocada às pressas a fim de o IBGE comunicar que errara: a desigualdade de renda não só não aumentou, como diminuiu. O índice de Gini, usado nessas medições, não passara de 0,496 para 0,498 — quanto mais próximo de 1, pior —, mas caíra até 0,495.

A taxa de desemprego de 6,5% — acima dos 6,1% calculada em 2012 — foi mantida, porém a população desocupada cresceu menos: 6,3%, em vez de 7,2%.

O diretor de pesquisas da instituição, Roberto Olinto, explicou o erro, cometido na extrapolação para todo o país das informações levantadas na amostra. O equívoco técnico distorceu dados referentes a sete estados: São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul, Minas, Bahia, Pernambuco e Ceará, onde estão 59% da população brasileira.

Já na quinta-feira, ao comentar os resultados negativos, o ministro secretário de Assuntos Estratégicos, Marcelo Neri, ele mesmo um economista pesquisador neste campo, chamava a atenção para o fato de a Pesquisa Mensal de Emprego (PME), também do IBGE, indicar uma redução da desigualdade de renda em 2014. Deduz-se que o IBGE recebeu ordens para rever os cálculos.

A instituição, pela reputação e história, é e continua inatacável. “Foi algo extremamente grave. Toda vez em que o IBGE erra, é nosso dever tornar isso público e pedir desculpas a toda a sociedade”, declarou a presidente do instituto, Wasmália Bivar. Fez bem.

Mas as circunstâncias não ajudam. A campanha eleitoral em si já amplificará as repercussões da revisão de última hora da Pnad, e mais ainda porque os novos cálculos devolveram à presidente-candidata argumentos para se apresentar nos palanques como campeã na luta contra a pobreza.

Por outro lado, o relacionamento tortuoso do governo Dilma com estatísticas oficiais sempre estimula suspeitas de malfeitos com os números. Difíceis de acreditar no caso do IBGE, reconheça-se.

Com a campanha eleitoral em fase de reta final para o primeiro turno, é possível, no entanto, que o conteúdo da pesquisa fique em segundo plano nos debates, infelizmente.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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