A trilha do dinheiro
Esquema do centrão vai de emendas sem critério técnico a empreiteiras obscuras
Com o enfraquecimento da Presidência nos últimos anos, o Congresso assume poder crescente sobre o gasto federal; sob Jair Bolsonaro (PL), a aliança com o centrão impulsiona despesas incluídas por deputados e senadores no Orçamento; graças a essas emendas parlamentares, elevam-se os recursos da estatal Codevasf.
Siga o dinheiro —a recomendação consagrada em língua inglesa para investigações intrincadas— e será constatado que os contratos da Codevasf privilegiam duas empreiteiras maranhenses pouco conhecidas e de práticas no mínimo heterodoxas, reveladas pela Folha.
Seus dois donos no papel já declararam não sê-lo de fato, numa investigação policial de 2015. O verdadeiro mandachuva seria Eduardo José Barros da Costa, réu nas Justiças Estadual e Federal em ações referentes a casos de corrupção.
Corrupção, claro, é a primeira suspeita a vir à mente em casos de transações mal explicadas entre governo e empreiteiras —e há elementos para dar início a uma apuração rigorosa. Mas há outros danos ao Orçamento e à política pública em jogo. Cumpre fazer de volta a trilha do dinheiro.
As verbas da Codevasf subiram de R$ 1,7 bilhão (valores corrigidos), em 2018, para R$ 2,1 bilhões neste ano, mais da metade oriundos de emendas parlamentares. O aumento se deu num período em que os investimentos federais como um todo minguaram. Antes mais voltada à irrigação, a estatal diversificou seus projetos.
Mais recursos não significaram bons serviços, como mostram o asfalto esfarelado em Petrolina (PE) e as crateras em Imperatriz (MA). A pulverização do gasto público em obras paroquiais, sem análise de relevância, tende a reduzir sua eficiência econômica e social.
É desejável, numa democracia, que o Congresso seja decisivo na elaboração do Orçamento. Mas tal papel deve implicar responsabilização e prestação de contas.