CLT, 80 anos (seguido de comentário nosso atualizado)

By | 04/05/2023 10:23 am

Surgida sob Vargas e alterada em 2017, lei trabalhista está sujeita a retrocesso

 

(Editorial da Folha, em 03/05/2023)

 

Rua 25 de Março, tradicional centro de comércio informal na cidade de São Paulo (SP) – Rivaldo Gomes/Folhapress

baixa eficácia da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que acaba de completar 80 anos, pode ser constatada com clareza nas estatísticas do emprego no país.

De acordo com os dados mais recentes do IBGE, relativos ao primeiro trimestre deste ano, 38,2 milhões de brasileiros trabalham com carteira assinada no setor privado e fazem jus aos direitos que a legislação promete garantir.

Um contingente quase idêntico, de 38,1 milhões, está na informalidade. São empregados sem carteira, incluindo domésticos, autônomos e empregadores sem CNPJ. O restante da população ocupada é composto por funcionários do setor público (11,8 milhões) e autônomos e empregadores regularizados (que somam 9,7 milhões).

A exclusão de tantos brasileiros demonstra que a CLT, no afã de regular as relações entre capital e trabalho até a minúcia, acaba por não se adequar à realidade nacional. Os resultados da reforma da legislação promovida em 2017 ainda são incipientes para avaliação.

As novas regras tiveram os objetivos corretos de permitir maior flexibilidade nos contratos e fortalecer as negociações coletivas, garantidos direitos básicos. Já houve sucesso na redução dos contenciosos na Justiça Trabalhista, mas a geração de empregos formais é prejudicada pela escassez de vigor da atividade econômica.

Ao longo do ano passado, quando houve expressiva melhora do mercado de trabalho, a população ocupada aumentou de 95,7 milhões para 99,4 milhões, enquanto o número de informais teve pequena queda, de 38,9 milhões para 38,6 milhões. A continuidade dessa melhora, porém, é incerta, dada a desaceleração do PIB.

A octogenária CLT está decerto enraizada na cultura política do país. Sua primeira versão, em decreto-lei do regime autoritário de Getúlio Vargas, data de 1º de maio de 1943, num período de crescente intervenção do Estado nas relações econômicas e sociais —discute-se na academia o quanto ela teve de influência do fascismo.

O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem intenção explícita de interromper o processo de liberalização das normas, incluindo aí uma ofensiva contra o trabalho por meio de aplicativos.

Será um retrocesso retomar, por ideologia ou corporativismo, a obsoleta orientação controladora e paternalista que décadas atrás inspirou a hoje remendada CLT.

editoriais@grupofolha.com.br

Comentário do programa

Diante dos números de informais (sem carteira assinada) seria interessante comparar os índices dos Estados do Sul com os índices no Nordeste. As empresas de maior porte, e no Sul elas predominam, geralmente não mantém empregados sem registro. Na nossa experiência, como auditor fiscal do trabalho, sentimos isso. Há uns oito anos, numa fiscalização que fizemos em Patos, notificamos quarenta lojas no Centro da cidade, e tivemos que multar vinte e quatro delas por empregados sem registro. Depois disso, houve uma mudança na fiscalização e as empresas passaram a ser multadas por empregados sem registro, em duas situações: uma primeira multa, hoje a multa inicial é de três mil reais. Na época a multa era apenas de quatrocentos reais por empregado. Com a mudança, as empresas podiam receber uma segunda multa, se os empregados encontrados sem registro não fossem registrados dentro do prazo assinalado pela fiscalização. Esta segunda multa era em torno de dezessete mil reais. Mas não era rara a sua aplicação. Trabalhadores que estavam recebendo algum benefício social se recusava a entregar a carteira para ser registrada e muitos deles desapareciam. Encontrei caso de empregado que não aceitara que assinassem sua carteira porque, simplesmente, era foragido da Justiça. E, claro, não apareceu mais na empresa. Na nossa região, encontramos muitos casos de empregados que não queriam ter a carteira assinada por serem trabalhadores rurais e preferirem a aposentadoria como trabalhadores rurais, que não teriam direito que trabalhassem com a carteira assinada, cerca de quinze anos antes de chegarem à idade de aposentadoria. Outro caso de recusa, principalmente entre empregadas domésticas, mas também entre mulheres no comércio é o medo de perderem benefícios sociais como o bolsa-familia. Estes últimos casos, acredito que sejam os mais comuns de pessoas que continuam na informalidade na região Nordeste.  Outro caso é o de trabalhadores que estão recebendo seguro desemprego e temem perdê-lo em caso de terem a carteira assinada novamente. Este caso é um grande risco para o empregador, pois este é um caso típico de fraude ao seguro desemprego e a multa é de cerca de vinte mil reais. Há quem considere a CLT uma legislação obsoleta, mas na nossa cultura de “levar vantagem em tudo”, muitos empregadores não pagariam os direitos dos seus trabalhadores, não fosse a legislação trabalhista e a fiscalização do Ministério do Trabalho. Claro que há muitos trabalhadores que também contribuem para isto, ao não exigirem o respeito aos seus direitos. Na Paraíba, tinhamos, não sei se ainda persiste, um exemplo chocante. Na cidade de São Bento, a maioria das tecelagens, a maior atividade empregadora da cidade, pouquíssias empresas registravam seus empregados. A maioria das tecelagens fechavam suas portas, assim que sabiam da presença na cidade da fiscalização do trabalho. E permaneciam de portas fechadas, enquantos os fiscais lá permanecessem, justamente, para que os seus empregados não fossem encontrados sem registro. Dizem que, por conta da informalidade, muitos empresários teriam se mudado para Itaporanga, hoje forte concorrente de São Bento, justamente para trabalharem sem informalidade e sem a concorrência desleal dos que utilizavam empregados sem registro.  As empresas que formalizavam o registro de seus empregados, tanto em São Bento como em Itaporanga, mantinham grandes contratos de fornecimento de seus produtos, para grandes grupos empresariais, por isso formalizavam os contratos de todos os seus empregados. As outras tecelagens com trabalho informal abastecem o comércio local e os vendedores que se deslocam por todo o país. A informalidade destes vendedores, inclusive, era na época a dor de cabeça do Ministério Público do Trabalho, da Polícia Federal e do Ministério do Trabalho que pilhavam estes vendedores em todas regiões do país. (LGLM)

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Category: Nacionais

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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