Escândalos drenam a energia do País (seguido de comentário nosso)

By | 06/05/2023 7:02 am

É preciso investigar e punir eventuais crimes, mas o País não pode ficar refém da pauta penal suscitada por Bolsonaro. Problemas nacionais não serão resolvidos olhando no retrovisor

 

(Editorial do Estadão, em 06/05/2023)

 

Imagem ex-libris

Nenhum crime – seja contra o Estado Democrático de Direito, seja a inserção de dados falsos em sistema de informações da administração pública, seja qualquer outro tipo penal – deve ficar impune. Indícios criminosos devem ser apurados. Necessário em todas as situações, esse empenho investigativo se torna ainda mais imperioso quando envolve pessoas que ocuparam altos postos da República ou quando os bens jurídicos relacionados afetam diretamente toda a coletividade. Não é perseguição contra político nem indiferença com o princípio da igualdade de todos perante a lei. É reconhecer, de forma realista, que a resolução desses casos tem especial interesse público. Afinal, a aplicação da lei penal tem também uma importante dimensão comunicativo-pedagógica.

Reconhecida a necessidade de aplicação efetiva da lei penal, sem transigir com nenhum crime, é preciso alertar que o País não pode ficar refém dos escândalos criminais, sejam de que espécie for, envolvam quem envolver. A agenda nacional não pode ser determinada por operações policiais, por buscas e apreensões espetaculosas ou por vazamentos seletivos de áudios, vídeos e outros documentos. Todos esses elementos probatórios devem ser analisados e ponderados pelas autoridades competentes, com vistas à instrução do processo. Mas não podem substituir a pauta do País, que deve estar centrada na resolução dos problemas nacionais: orientada para o futuro, e não presa no passado.

A Lava Jato oferece importante aprendizado. Por maiores que sejam, os escândalos oriundos de delações e de vazamentos seletivos do Ministério Público não asseguram a aplicação da lei penal. Pode existir tudo isso e, mesmo assim, continuar havendo ampla impunidade. Não é o escândalo que faz com que o autor do crime seja identificado e devidamente punido. Isso se consegue por meio do devido processo legal, que não segue a lógica da audiência ou da popularidade, mas depende da apuração sóbria e atenta dos fatos, dentro das regras do contraditório e da ampla defesa.

Não é de estranhar que, depois de quatro anos de Jair Bolsonaro na Presidência da República, exista uma grande lista de indícios a exigir atenção do sistema de justiça penal. Para piorar, o 8 de Janeiro acrescentou uma nova e gigantesca leva de elementos probatórios, que precisam ser investigados. Não cabe impunidade perante tudo isso. Como lembrado várias vezes neste espaço, o caminho da pacificação social não é ignorar os crimes cometidos, mas aplicar sobre eles a lei de maneira técnica e imparcial, sem tom de vingança.

Esse cenário desafia o País em duas frentes: o desafio da efetiva aplicação da lei penal e o desafio de não deixar o País preso à aplicação da lei penal nesses casos. É um equívoco paralisante – que, entre outros danos, custa vidas, afeta empregos, prejudica a educação das novas gerações e freia o crescimento econômico – achar que o País não deve fazer outra coisa senão aguardar o julgamento – ou a prisão ou a inelegibilidade – de Jair Bolsonaro e dos envolvidos no 8 de Janeiro.

Há um País a ser governado. Há questões importantes em tramitação no Congresso Nacional, como, por exemplo, o novo arcabouço fiscal, a reforma tributária e a regulamentação das redes sociais. Por mais que seja preciso investigar eventual adulteração criminosa do cartão de vacinação de Bolsonaro, esse assunto – até certo ponto irrelevante, dado o conjunto da obra bolsonarista – não pode paralisar a agenda nacional. Por isso, entre outros cuidados, é fundamental que as medidas policiais e judiciais sejam realizadas dentro da mais estrita legalidade. O sistema de justiça penal não funciona bem quando gera tensão ou dúvidas na população.

No desafio de não deixar o País refém da pauta penal, dois temas demandam especial atenção. Quanto mais sigilo há sobre os procedimentos judiciais, maior é a possibilidade de manipulação da agenda nacional por meio de vazamentos seletivos. A regra é a publicidade. O segundo tópico são as prisões preventivas. Também excepcionais, elas exigem rigorosa fundamentação. Não convém repetir os erros da Lava Jato.

Comentário nosso

No caso das prisões preventivas, há a considerar o interesse da Justiça em apurar fatos ou analisar provas que possam vir à tona durante o processo e que podem ser escondidos se o suspeito  continuar em liberdade ou for liberado antes do tempo.  (LGLM)

 

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Category: Destaques

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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