Intervenção na estatal ainda ronda imaginário do setor público, alertam
O clima foi de alívio entre os investidores da Petrobras nesta terça-feira (16). O pior cenário para os reajustes de preços não se confirmou. A leitura predominante é que não ocorreu a temida volta ao passado, com uma intervenção direta da União no valor dos combustíveis, subsídios para bancar queda de preço e a simples suspensão da paridade com o valor internacional do óleo. A alta nas ações da companhia refletiu esse alívio.
Especialistas em óleo e gás ouvidos pela reportagem, no entanto, recomendam cautela e que se preste mais atenção ao discurso sobre o tema. Se a interferência não ocorreu agora, ela ronda o imaginário do setor público.
O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, por exemplo, descartou a leitura de que o fim da paridade na importação como baliza para o preço de petróleo possa ser interpretado como uma intervenção do governo na companhia.
O mesmo Prates, no entanto, lembrou que o fim do PPI (Preço de Paridade de Importação) é o cumprimento de uma promessa, pois a proposta de adotar um novo sistema de reajuste para o preço dos combustíveis no mercado interno foi anunciada ainda durante a campanha pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e aprovada nas urnas.
“O presidente Lula, quando fez a campanha, disse o que eu estou dizendo aqui: não faz sentido um país lutar pela autossuficiência, não faz sentido todos [os presidentes] desde Getúlio [Vargas] lutarem para ter parque de refino e, depois, a gente praticar o preço do importado como se a gente importasse 100%.”
O ministro Alexandre Silveira (Minas e Energia), fez comentários similares.
Ao mesmo tempo em que garantiu os esforços para a elaboração de um novo sistema de reajuste, que preserva a o preço internacional como referência, disse que a paridade “era abstração, uma mentira e crime contra o povo brasileiro, porque impunha uma mordaça a uma política de competitividade interna dos preços dos combustíveis no Brasil.”
O ministro destacou ainda que nacionalizar os critérios de reajuste da Petrobras era apenas o ponto de partida para uma mudança maior. “Era hora de abrasileirar os preços dos combustíveis”, afirmou. “E o governo Lula vai cobrar de todas as empresas, sejam quais sejam, que cumpram o seu papel social.”
O próprio Lula gravou um vídeo e postou no Twitter para comemorar a queda no preço dos combustíveis.
“Hoje, eu estou particularmente feliz, e acho que o povo brasileiro também vai ficar, porque o ministro de Minas e Energia e o presidente da Petrobras acabaram de anunciar a redução da gasolina e do óleo diesel em mais de 12%, e a redução do gás de cozinha em 21,3%”, afirmou.
“Vocês estão lembrados que iríamos abrasileirar os preços da Petrobras e começou a acontecer. É apenas o começo.”
Que seja na esquerda ou na direita do espectro político brasileiro, a história mostra que quando o barril do petróleo sobe, a tentação de segurar o preço dos combustíveis, a qualquer custo, aumenta na mesma proporção. Vale tudo na tentativa de evitar os efeitos nefastos para o bolso dos eleitores e para os indicadores de inflação.
Especialistas do setor de óleo e gás, que preferem não ter os nomes citados, afirmam que apenas o tempo e comportamento da Petrobras e do governo vão mostrar se as diretrizes anunciadas nesta terça serão seguidas à risca quando houver pressão altista —pois a nova metodologia, por si só, não é uma garantia.
O cálculo do PPI funcionava como uma espécie de seguro de que o governo não interferia nos preços dos combustíveis, uma vez que era baseado numa fórmula fixa.
Além de continuar utilizando o valor internacional como referência, a Petrobras anunciou que passará combinar duas variáveis para definir os preços internos.
O primeiro é o chamado “valor marginal para a Petrobras”, em outras palavras, garantir os melhores retornos dentro do plano da companhia. O segundo item é o “custo alternativo do cliente”, que pode variar de acordo as características do mercado com cada região atendida.
Isso significa que os preços podem variar em diferentes locais, mas sempre vão buscar os resultados programados.
Esses dois mecanismos, alertam os especialistas, não se baseiam em critérios objetivos e transparentes, assim, não garantem uma blindagem contra eventuais interferência da União. Também não há garantia de que a Petrobras, na posição de maior empresa do setor, não vai exercer força monopolista sobre os concorrentes, fornecedores ou mesmo alguns clientes.
Os senadores entenderam a dicotomia que se instalou. Por sugestão do senador Alessandro Vieira (PSDB-SE), a CAE aprovou convite para que Prates explique a mudança. Vieira, na sua manifestação, explicou o desafio que o Brasil voltou a ter.
“O que se busca é garantir o funcionamento adequado da empresa. Nenhuma empresa pode funcionar nem a base de preços excessivos, que arrochem o consumidor, e muito menos com preços subdimensionados, que destruam a empresa”, afirmou o senador.
“O Brasil já vivenciou os dois extremos. O que queremos é confirmar que a intenção da Petrobras agora é funcionar como uma empresa eficiente e qualificada.”