Ministros defenderam que restrição prevista no Código Civil pode ser afastada se houver expressa manifestação de vontade das partes
O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quinta-feira (1º), por unanimidade, que pessoas com mais de 70 anos não são obrigadas a se casar em regime de separação de bens.
Os ministros consentiram que esta condição, prevista no Código Civil, pode ser afastada se houver expressa manifestação de vontade das partes por escritura pública.
A tese tem repercussão geral, ou seja, deve servir de parâmetro para o julgamento de casos semelhantes em todo o país.
A regra foi instituída em 2002 para prevenir o chamado de “golpe do baú”, em que uma pessoa muito mais jovem se une oficialmente a outra de idade avançada para herdar seu patrimônio.
Ele argumentou que a regra violava o princípio da dignidade da pessoa humana e o da igualdade, como no ponto da autonomia individual. Isto porque, segundo o ministro, ela impede que pessoas capazes de praticar atos da vida civil façam escolhas existenciais. Além de tratar idosos “como instrumentos para a satisfação do interesse patrimonial de seus herdeiros”, afirmou.
“O princípio da igualdade, por sua vez, é violado por utilizar a idade como elemento de desequiparação entre as pessoas, o que é vedado pela Constituição, salvo se demonstrado que se trata de fundamento razoável para realização de um fim legítimo”, disse.
O ministro defendeu que as pessoas idosas, enquanto conservarem sua capacidade mental, têm o direito de fazer escolhas acerca da sua vida e da disposição de seus bens.
Já a ministra Cármen Lúcia chegou a criticar o etarismo da população e destacou que o preconceito é maior entre as mulheres.
“O etarismo é uma das formas de preconceito dessa sociedade enlouquecida na qual vivemos, [que prega] ser jovem e feliz sempre. Ninguém é jovem e feliz sempre, a não ser que morra antes de continuar. Feliz o tempo todo, neste mundo em que vivemos, não é tarefa fácil”, afirmou, em seu voto.
Uma decisão em primeira instância havia reconhecido a cônjuge como herdeira, mas acabou reformada depois que os filhos do homem recorreram. Embora tenha confirmado a união estável, o Tribunal de Justiça de São Paulo aplicou o regime de separação de bens, uma vez que o marido tinha mais de 70 anos quando a relação foi selada.
Os autos foram encaminhados para o STJ (Superior Tribunal de Justiça) e, em seguida, para o STF.
Advogados especializados em direito de família e sucessões consultados pela Folha disseram concordar com o entendimento do Supremo.
“A decisão anterior feria a dignidade da pessoa, partindo da premissa de que qualquer relação com pessoa com mais de 70 anos tinha um interesse patrimonial”, disse Silvia Felipe Marzagão, advogada e presidente da Comissão de Família e Sucessões da OAB-SP.
“Hoje, a expectativa e a qualidade de vida são diferentes. Pessoas com 70 anos ou mais estão ativas, exercendo suas atividades e compreendendo perfeitamente todos os aspectos de suas vidas patrimoniais e financeiras”, acrescentou.
Para Rodrigo Cunha Pereira, presidente do IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito Família), a decisão valoriza a autonomia das pessoas idosas.
“Uma pessoa de 70 anos pode governar o país. O presidente [Lula, 78] toma decisões importantíssimas”, afirmou Pereira.
Comentário nosso
Tem toda a razão o Supremo Tribunal Federal na sua decisaão. Se um cidadão com mais de setenta anos pode ser presidente da República, por que não podia casar com comunhão de bens. Que não se veja aí nenhuma alusão ao casamento de Lula, dois dias mais jovem do que eu. Se houver má fé no casamento, que se permita até a sua anulação, mas não tinha sentido proibir que o maior de 70 anos, na plenitude da consciência, casar-se em comunhão de bens. A separação ou comunhão de bens deve ser um decisão pessoal do casal e não uma imposição legal. Aliás eu nunca esqueci de um caso de alguns anos atrás, de um cidadão de mais de setenta anos que ia casar com uma cidadã bem mais nova e um padre amigo meu disse que só faria o casamento depois que o noivo dotasse a noiva pelo menos com uma casa para morar depois que ele morresse. Disse que não tinha sentido ela servir de cuidadora para ele sem nenhuma segurança futura. (LGLM)