A preservação da imunidade parlamentar (seguido de comentário nosso)

By | 10/05/2023 7:33 am

Projeto sobre plataformas digitais não cria exceções a políticos. Só prevê, corretamente, que as prerrogativas constitucionais dos parlamentares também devem valer nas redes sociais

(Editorial do Estadão, 10/05/2023)

 

Imagem ex-libris

No entanto, em vez de explicitar um defeito estrutural do projeto de lei ou um generalizado mau caratismo dos políticos, essa crítica expõe como o debate sobre tema vital para o País está sendo feito não apenas em termos rasos, como tem sido descaradamente manipulado. O PL 2.630/2020 não cria exceções para políticos. O dispositivo tão criticado, que supostamente privilegiaria os parlamentares, apenas dispõe que a imunidade prevista no art. 53 da Constituição – “os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos” – também se aplica “aos conteúdos publicados por agentes políticos em plataformas mantidas pelos provedores de redes sociais e mensageria privada”.

Nesse ponto em concreto, o PL 2.630/2020 não faz, portanto, nada além do que assegurar a vigência da Constituição nas redes sociais. Trata-se de objetivo adequado e estritamente necessário para um projeto de lei que vem estabelecer um novo marco jurídico para as plataformas digitais.

Na crítica à tal “exceção para os políticos” do PL 2.630/2020, vislumbra-se na verdade uma grande incompreensão sobre as prerrogativas constitucionais dos parlamentares. Elas não constituem privilégios pessoais nem criam uma categoria especial de cidadãos, sobre os quais as leis aplicáveis a todos os demais não valeriam. Fossem assim as imunidades parlamentares, o sistema constitucional seria incoerente e disfuncional, já que o Estado Democrático de Direito se estrutura a partir do princípio basilar da igualdade de todos perante a lei.

As prerrogativas parlamentares – entre as quais se inclui, conforme o art. 53 da Constituição, a inviolabilidade civil e penal por opiniões, palavras e votos – são uma proteção do regime democrático e efetivo respeito aos direitos políticos de todos os cidadãos. Elas não foram criadas por diletantismo. Como a história ensina, a perseguição contra parlamentares costuma ser uma das primeiras medidas impostas por ditaduras. Às vezes, é realizada diretamente, sem nenhum pudor; outras, por meio de processos judiciais enviesados e parciais, cuja função é tão somente dar aparência de legalidade aos desmandos do regime despótico.

Por isso, as prerrogativas parlamentares não têm nada de imoral ou de antirrepublicano. Não são uma concessão à impunidade nem representam uma espécie de legislação em causa própria. A inviolabilidade de senadores e deputados por opiniões, palavras e votos ajuda a construir as condições para um debate livre e plural de ideias, elemento essencial do regime democrático.

Tal como o texto constitucional dispõe e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) reconhece, essa inviolabilidade não é autorização para a prática de crimes, também no ambiente virtual. No ano passado, a condenação pelo STF do deputado federal Daniel Silveira a oito anos e nove meses de prisão mostrou o equívoco de quem pensava que o art. 53 da Constituição preservaria os parlamentares dos efeitos da lei – em concreto, da lei penal.

Na verdade, o PL 2.630/2020 cria obrigações adicionais aos políticos. Por exemplo, em suas contas oficiais, os parlamentares “não poderão restringir a visualização de suas publicações”.

O País não pode ficar refém de narrativas manipuladoras. É hora de debater responsavelmente, sem fantasmas, a necessária regulação das plataformas digitais.

Comentário nosso

Mea culpa. Eu próprio fui induzido em erro e critiquei uma possível abertura de exceção na imunidade parlamentar criada na nova Lei. Os parlamentares já têm esta imunidade assegurada pela Constituição, também nas redes sociais. (LGLM)

Comentário

Category: Blog

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *