Processo sobre ataques ao sistema eleitoral em encontro com embaixadores está na fase final
(Renata Galf, na Folha em 11/05/2023)
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) é alvo de 16 ações no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que podem torná-lo inelegível.
Uma delas está no estágio final e deve ser a primeira a ir a julgamento. Resta ser apresentado voto do ministro relator e corregedor eleitoral, Benedito Gonçalves, e que o presidente da corte, o ministro Alexandre de Moraes, paute a ação para julgamento.
ENTENDA A AÇÃO QUE PODE TORNAR BOLSONARO INELEGÍVEL
1. Quem apresentou a ação e qual seu foco? A AIJE (ação de investigação judicial eleitoral) contra Bolsonaro que está mais adiantada foi apresentada pelo PDT –partido que tinha Ciro Gomes, como candidato à Presidência. Ela tem como foco a reunião com embaixadores realizada pelo então presidente em julho do ano passado.
3. Qual a punição? Se for declarado inelegível pelo TSE, Bolsonaro, 68, não poderá disputar eleições por oito anos —prazo que conta a partir da eleição de 2022. Advogados ligados ao caso avaliam que, se houver condenação, dependendo do entendimento da corte, haveria discussões sobre a possibilidade de ele voltar a disputar eleições em 2030 ou só em 2032.
Caso o entendimento do TSE seja de que Bolsonaro praticou ato de abuso de poder, ele ficaria barrado inclusive em 2030, já que, para essa condenação, a data da inabilitação começaria a contar a partir de janeiro de 2023. Num cenário menos desfavorável para Bolsonaro, porém, em que ele venha a ser condenado por conduta vedada, advogados dizem que haveria margem para discutir se Bolsonaro já poderia concorrer no pleito de 2030.
4. O que foi a reunião com embaixadores? Em julho do ano passado, Bolsonaro convidou dezenas de representantes estrangeiros para falar sobre o sistema eletrônico de votação do país. O evento durou cerca de 50 minutos e foi transmitido pela TV Brasil. Na ocasião, a Secretaria de Comunicação do governo barrou a imprensa, permitindo apenas a participação dos veículos que se comprometessem a transmitir o evento ao vivo.
5. O que Bolsonaro disse durante o encontro? Ele repetiu uma série de teorias conspiratórias sobre as urnas eletrônicas e o sistema eleitoral. Disse, por exemplo, de que votos em 2018 que seriam nele teriam ido para outro candidato, adicionando que o próprio TSE teria dito que “em 2018 números podem ter sido alterados”. Também fez ataques aos ministros da corte e afirmou que eles queriam trazer instabilidade para o país e que não aceitavam as sugestões das Forças Armadas para o processo eleitoral.
6. Quais os ilícitos apontados pelo PDT na ação? O PDT diz que Bolsonaro praticou abuso de poder político, que ocorre quando o detentor do poder utiliza de sua posição “para agir de modo a influenciar o eleitor”, prejudicando a liberdade de voto. Além disso, afirma que fez uso indevido de meios de comunicação social –ao usar redes sociais para veicular ataques à integridade do sistema de votação. O partido aponta também que teria havido uso indevido do aparato estatal, pelo evento ter ocorrido no Palácio da Alvorada, com transmissão pela TV Brasil.
7. Quais os requisitos para condenação? Entre os requisitos para condenação em uma AIJE está a gravidade do fato apontado. Para essa análise, o TSE usa balizas como a amplitude do ato abusivo (quantas pessoas podem ter sido afetadas); quão ligados à campanha do candidato os atos estavam; e o peso moral da conduta.
8. O que argumentou o PDT? Segundo o autor da ação, Bolsonaro desvirtuou a realização do ato, que deveria estar ligado ao interesse público, “para propagar seu programa de campanha, que dentre poucas coisas, abarca os ataques à integridade do processo eleitoral como principal sustentáculo de discurso”. O teor das falas de Bolsonaro não chega a ser rebatido na ação do PDT, que afirma que o caráter falso das afirmações já tinha sido apontado pela própria Justiça Eleitoral, pelo TCU (Tribunal de Contas da União) e também por agências de checagem e veículos de imprensa
10. Qual o atual estágio da ação? As próximas etapas são a apresentação do voto do relator da ação, o corregedor Benedito Gonçalves, e o julgamento pelo plenário do TSE, sendo que a definição da data fica a cargo do presidente do TSE, Alexandre de Moraes.
11. Quais foram as etapas anteriores? A ação do PDT foi apresentada ainda durante as eleições, em agosto. A fase de coleta de provas foi encerrada no fim de março, após decisão de Gonçalves, quando foi aberto prazo para que tanto o PDT quanto a defesa de Bolsonaro apresentassem suas alegações finais. Na sequência, abriu-se prazo para manifestação da Procuradoria Eleitoral. Desde o dia 10 de abril, a íntegra do conteúdo da ação foi colocada sob sigilo provisório.
13. Quais provas foram coletadas? O vídeo do encontro com embaixadores foi entregue pelo próprio PDT ao ingressar com ação. Além disso, foi deferido pedido do partido para inclusão da minuta golpista encontrada pela Polícia Federal durante busca e apreensão na casa de Anderson Torres, que foi ministro da Justiça sob Bolsonaro. O documento propunha um decreto para instaurar estado de defesa na sede do TSE para rever o resultado do pleito. A defesa de Bolsonaro contestou a inclusão. Também foram incluídos documentos do processo administrativo instaurado pelo TSE em 2021 para investigar ataques à lisura do sistema eleitoral.
14. Quantas testemunhas foram ouvidas? Ao longo da coleta de provas, o corregedor diz ter deferido o depoimento de nove testemunhas apontadas pela defesa, conforme escreveu Gonçalves na decisão que encerrou essa fase do processo. Seis prestaram depoimento, como o senador e ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro, Ciro Nogueira (PP-PI). Teria havido desistência sobre três delas. O relator elenca ainda que outras três testemunhas foram ouvidas por determinação do tribunal, entre elas Anderson Torres.
15. Qual a atual composição do TSE? O TSE é formado por 7 ministros, dos quais 3 são oriundos do STF (Alexandre de Moraes; Cármen Lúcia e Kassio Nunes Marques); 2 do Superior Tribunal de Justiça (Benedito Gonçalves e Raul Araújo Filho); e 2 são advogados indicados pelo Supremo (Sérgio Silveira Banhos e Carlos Bastide Horbach). Os advogados terão o mandato encerrado neste mês. Kassio Nunes Marques é o novo titular, após aposentadoria do ministro Ricardo Lewandowski em abril. Além dos titulares, há 7 ministros substitutos.